sexta-feira, 29 de abril de 2016

Carta aos Amigos



Hoje é um dia diferente. Sempre imaginei como seria a minha saída da Oi e confesso que nunca esperei grandes emoções. Imaginava como seria sair pela catraca e olhar para trás. Me julgava forte e um pouco superior a isto tudo. De certa forma, percebo minha arrogância de adulto, daquelas que, na maioria das vezes, só reconhecemos no vazio. Hoje foi assim. 

Não serei hipócrita de dizer que sentirei falta de alguns projetos que parecem sem sentido ou algumas reuniões intermináveis de acareação de números. Como uma casa desarrumada que incomoda a qualquer um que chega, mas cujos moradores conseguem se encontrar. As vezes, pode ser difícil encontrar o sal ou açúcar, mas no fim do dia, ninguém fica sem jantar. Uma bagunça organizada ou uma organização desarrumada. Não importa. Como toda família, nenhuma é perfeita. Podemos até comentar os próprios deslizes, mas ai de quem ousar de fora falar mal da nossa família. A Oi é assim. Tem mesmo uma lógica própria que inexplicavelmente parece funcionar. Certamente, mérito de muito esforço individual que sobressai no coletivo. Uma luta da competência diária daqueles que escolhem todos os dias fazer diferente. Fácil é navegar em águas calmas. Enfrentar a turbulência de mares revolto não é para qualquer um, precisa mesmo de muita transpiração para não nausear e manter a proa no rumo. Esta sim é tarefa para grandes marinheiros. Admiro a resiliência daqueles que fazem parte dessa embarcação. E agradeço a todo o convívio, paciência e aprendizado. 

Sim, estou feliz e empolgado com a oportunidade da mudança e a possibilidade de escrever uma nova história. Assusta e ao mesmo tempo inspira. Difícil traduzir em palavras. Mas o que hoje é inegável é mesmo a falta que cada um fará em minha rotina. Um sorriso, piada no meio da tarde, almoço descontraído ou mesmo aqueles mais rápidos no Da Silva, gaveta de lanche coletivo, imitações de fazer inveja em qualquer stand-up comedy, músicas que eu jamais teria ouvido no meu rádio (aqui vale citar o clássico baile de favela), momentos de dar ou receber conselhos, discussões acaloradas, discussões intermináveis, confraternizações, conversa ao pé de ouvido no corredor, situações inusitadas com direito a uma queda porque o "pé dormiu", novos sotaques, novas expressões que incorporei em meu vocabulário e eu nem sabia que poderiam existir no mundo dos negócios (destaques para coreografia e peça orçamentária), alegria e tristeza compartilhadas, gente que casa, gente que se separa, filhos que crescem, filhos que estão por vir, ou um simples bom dia as vezes doce, as vezes azedo. 

Este é o grande mistério da vida. Simplesmente aceitar que as pessoas se conectam por algum propósito muito maior do que nossa rasa consciência é capaz de entender. Algumas pessoas entram e saem da nossa vida, outras permanecem, outras vão e voltam. Mas não importa. É tolice tentar controlar ou mesmo entender. Mesmo quando acreditamos que somos pilotos absolutos do nosso destino, a vida pode dar uma rasteira, mas sempre mostrará novos caminhos e que no final somos todos passageiros de uma grande viagem. 

Qualquer marinheiro precisa da sabedoria de deixar fluir, perceber a hora de atracar ou partir. Embora clichê, um barco jamais será o mesmo, nem quando chega, nem quando sai. De alguma forma, as pessoas permanecerão conosco por aquilo que elas deixam na gente. Se você está recebendo esta carta, é porque de alguma forma se eternizou em mim. Espero que eu possa ter contribuído com alguma marca positiva, assim como eu recebi de vc. E me perdoe por eventuais ausências ou exageros que eu possa ter cometido, mas falhar também é parte inerente da nossa condição humana.

Por fim, só posso dizer obrigado. Obrigado por ter feito parte da minha jornada e tornado esta viagem mais divertida. Quem sabe não nos reencontraremos na próxima estação. Minha eterna gratidão em forma de chocolate. 

Com carinho, Edu Guedes.

segunda-feira, 11 de abril de 2016

Pai Heroi


Texto por Dudu Guedes.

Talvez ele nem saiba, mas ha muito mais dele em mim do que a rasa visão dos olhos pode enxergar. 

Ele me mostrou as coisas grandiosas da vida, daquelas com cheiro de infância, que não precisam de luxo ou dinheiro. Lembro das vezes em que andávamos descalços na beira do mar ou que assistíamos partidas de futebol na areia com sabor de pipoca doce de carrocinha. Ele me ensinou a valorizar a simplicidade.

Quando saíamos para empinar pipa, certamente ele se divertia mais do que eu. Sem problemas, eu ficava admirando o quão alto ele conseguia subi-la. Certa vez, decidiu andar no meu velocípede em Teresópolis. Não deu certo, abri o berreiro e minha mãe veio me consolar. Tudo bem. Perdi um brinquedo mas ganhei outra coisa. Aprendi que ser criança não tem a ver com a nossa idade mas sim com o coração.

Quando eu tinha 16 anos, trabalhei junto com ele no escritório de contabilidade. Reconheço que decidi não seguir a profissão. Mas íamos juntos a igreja após o almoço para orar e agradecer em silêncio. Todos os dias. Nunca soube o que ele pedia, mas sem saber ele me ensinou a trabalhar a minha espiritualidade.

Ele era como um pai-heroi, parecia mesmo invencivel. Nao foi assim. A bebida o revelou humano, e mostrou que todos temos falhas. Qualquer superman também tem suas horas de clark kent. Mas isso não diminui o amor. Foi quando ele me ensinou como se faz um guerreiro. Com fe, forca e resiliencia, eh possível superar as adversidades, vencer a kriptonita e se tornar maior e mais forte. 

Aos 69 anos ele ainda sai para trabalhar todos os dias as 5:30 da manha e nunca vi ele perder a hora em um dia sequer. Enfrenta a subida das montanhas em cima da sua bicicleta com a energia e leveza de um menino. O esporte o livrou do vicio e passou a inspirar tantas outras geracoes. Na sua ultima prova de ironman, fui de moto do seu lado. Fiquei cansado e quase abandonei o percurso. Mas ele nao desistiu. Me pediu apenas uma camisa e 1 dorflex e continuou correndo. Completou com incriveis 12h:53 aos 60 anos de idade. 

Escrevia poesias de altíssima qualidade sob o codinome de Carlos Bardega. Me explicou que Bardega era a mistura de bar com adega, em referencia a época em que o vicio ainda o dominava. Sempre antes de entrar no carro, ele abre a porta do carona para você entrar. Faz isso sempre e para qualquer um. Ele me transmitiu o dom da gentileza.

Obrigado por me inspirar. Obrigado por fazer parte de mim e da minha jornada. Minha eterna gratidao pelo que sou e pelo que aprendi com vc. Meu pai, aquele que se confirmou heroi ao se revelar humano. Que eu ainda possa retribuir em vida tudo que recebi de vc. Amém.