quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Decisões e Escolhas


Texto by Dudu Guedes

Dizem que somos o reflexo das nossas escolhas. Que toda decisão tem um renúncia. Algumas tem várias renúncias. Verdade. E assim, meio que sem saber, ou sem nos dar conta, vamos tomando decisões todos os dias. Das mais simples às mais complexas. Acordar cedo ou chegar tarde no trabalho. Fazer ou não a barba. E vamos nos moldando, criando novas perspectivas e novas visões sobre o mundo.

E no meio destes pensamentos, percebi que existem 2 tipos de atitudes que podem ser coerentes ou divergentes entre si. Uma é a atitude externa, que chamo de escolhas. É quando externamente escolhemos por um novo emprego, uma nova relação, um novo hobby. Escolher significa movimentar o mundo exterior de acordo com o que pensamos ser o mais certo naquele momento. Mas escolhas nem sempre são acompanhadas das decisões. Decisões são muito maiores. As decisões são as atitudes internas. É como internalizar uma escolha que fizemos no mundo exterior. Penso que a maioria dos sofrimentos são originados pela incoerência das decisões e escolhas que atualmente vemos em muitas pessoas, em muitas famílias. Escolhemos no mundo exterior o que não decidimos internamente. Ou o contrário, decidimos internamente o que não temos coragem de escolher.

Escolher é optar por uma alternativa, decidir é encerrar as outras alternativas. Manter o emprego ou arriscar-se num nova empreitada, viajar ou fincar raiz, morar com os pais ou sair de casa, ir tomar um chopp com os amigos ou fazer uma surpresa para a namorada, ficar solteiro ou casar, cuidar do cachorro ou lavar o carro, manter o filho numa escola tradicional ou lança-lo num novo ambiente, mudar de cidade ou não ... Coisas simples ou mais complexas, mas simplesmente escolhas e decisões.

Precisamos ter mais coerência entre ações e pensamentos. Quando nossas escolhas não são acompanhadas por uma decisão ou quando uma decisão não é acompanhada por uma escolha, prolongamos um ciclo e isso gera dor, às vezes sofrimento.

Entretanto muitas vezes, vemos escolhas que são tomadas justamente como forma de gerar uma decisão. É como se o mundo exterior fosse um campo de treinamento para internalizar uma opinião. Mas não é. Como se a vivência pudesse apontar as respostas.

Em outras vezes, vemos que as decisões não são acompanhadas pelas escolhas. Vemos pessoas que internalizam uma decisão, mas tem tanto medo de fazer uma escolha. Medo de arriscar ou de perder, renunciar. Deixar para a vida tomar as decisões. Perigoso. Mas estas mesmas pessoas ignoram que não tomar uma decisão já é uma decisão. Por isso vemos tantas pessoas infelizes no próprio emprego ou casamento. Sabem que não são felizes, já tomaram uma decisão interna, mas não tiveram coragem de escolher a mudança. Ficaram presas no casulo dos seus tortos pensamentos ou atitudades. Tem pessoas que pensam demais e agem de menos, já outras agem demais e pensam de menos ... Desequilíbrio no ecossistema interpessoal.

Por outro lado, temos que respeitar nosso momento, nosso caminhar, nosso tempo. O tempo do coração nem sempre é o tempo do relógio. Em geral não é. Como diz na música, "ando devagar porque já tive pressa".

Mas para não parecer um texto tão frio, é importante lembrarmos das pessoas coerentes. Dignas de muita admiração. Pessoas que lutam pelo que acreditam. Que antes de tudo, sabem no que acreditam. São pessoas leves, companhias saudáveis, com bom humar e astral contagiantes. Corajosas. De cabeça erguida. Pessoas que vivem com a pureza infantil. Nunca vi uma criança com esses conflitos. Crianças escolhem e decidem automaticamente.

O voo-livre é para mim como um exercício de escolhas e decisões. É como voltar a ser criança e voar pela terra-do-nunca do nosso imaginário, escolhendo a nuvem que iremos tocar. Às vezes, estamos a quase 2.000 m de altura do solo e temos que escolher e decidir uma rota. Isso significa muitas vezes optar por uma caminho de nuvens mais promissor, com mais térmicas prováveis para um vôo mais longo. Por outro lado, esta decisão às vezes traz a renúncia de pousos seguros. Certa vez, pousei no topo de um morro no cerrado, sem acesso a carro. O resultado foram 2 horas de caminhada até a fazenda mais próxima e um pôr do sol de perder o fôlego. Apesar de estar sozinho neste dia, parecia tão bem acompanhado. Com uma força divina que me acompanhava. Meu anjo da guarda é sem dúvida um segurança invejável. Preciso dar umas férias para ele.

Que em 2011, seja possível fazermos escolhas coerentes e principalmente decidirmos. Só depende de cada um de nós. E lembrarmos que nem sempre o que queremos é o que precisamos. O resto é ter fé e gratidão, que com certeza o universo irá nos retribuir com o que tem de melhor e necessário para cada um de nós. Amém.

O menino do meio-fio


By Dudu Guedes

Ontem parei na padaria ao lado de casa, em Niterói. Era bem cedo, quase 07:30, e ao sair do carro uma cena me chamou a atenção. Um menino de quase 7 anos de idade estava sentado na calçada, com o rosto escondido entre as pernas. Parecia congelado, imóvel, e imaginei que estivesse dormindo.

Refiz o meu ritual matinal. Como um bom carioca, li o globo enquanto tomava um suco de melancia e comia um pão na chapa ... Tudo seria praticamente igual, não fosse a minha surpresa ao retornar para o carro. Lá estava ele. O mesmo menininho, parado na mesma posição, quase 20 minutos depois ... Duas outras crianças chegaram até o carro. Simpáticas e muito educadas, me falaram: "está vendo, ele está aí há dias, disse que veio do Rio". Com um aperto no coração, perguntei pelos pais do menininho. "Ele quase não fala", essa foi a resposta que congelou ainda mais minhas emoções ...

Desci do carro e fui até o menininho. "Acorda", falei suavemente sem obter resposta. "Ei, cade seus pais ?", perguntei. Nenhuma resposta. O corpo estava imóvel. Desta vez, fui mais insistente e com um cafuné tentei lhe acordar. Ele mexeu a cabeça sem muita vontade. Suas canelas estavam machucadas, como se tivesse rolado de algum lugar. As 2 outras crianças tentaram me ajudar. Ofereci leva-lo de volta ao Rio ignorando todos os meus compromissos diurnos. Algumas coisas que acontecem tem prioridade, pensei. E sem dúvida, o direito a vida de uma criança sempre fala mais alto do que qualquer reunião de trabalho. Mesmo que essa reunião fosse com o prefeito. Temos um compromisso individual com as coisas que acontecem a nossa volta. O menino não reagiu, permaneceu imóvel. Confesso que meu coração é meio mole. Ultimamente choro até em comercial de doriana e paredão de big brother. Nem tanto. Mas a verdade é que não consigo simplesmente ignorar uma cena como esta ...

Não consegui em nenhum momento ver claramente o seu rosto. Mas o corpo, magrinho, de pele clara, lembrava meu sobrinho ... Certamente, isso me trazia ainda mais sensibilidade a flor da pele. A atendente dentro da padaria perguntou pelo vidro se ele estava chorando. Disse que ele estava perdido.

Enquanto tentávamos animá-lo e extrair algumas palavras, conversei com as outras 2 crianças. Uma delas, um menino de quase 6 anos, mostrou as marcas de queimadura no braço e disse que um "coleguinha" de rua jogou álcool e fogo nele. Me falou que sua mãe trabalhava para tentar pagar uma cirurgia de reconstrução da pele. R$ 1000 reais o preço. Todos os dias ele ia até o estacionamento da padaria e tentava chegar em casa com R$ 20. Metade ficava para sua mãe e a outra metade para ele. Lhe dei R$ 10 e disse, "pronto, agora vc pode voltar para casa. Mas esse dinheiro é seu". Eu pensei que estivesse lhe ensinando alguma coisa, pura tolice e ingenuidade. Ele sem saber me transmitiu uma sabedoria muito maior. Olhou para seu amigo e me disse: "é nosso, nós sempre dividimos". E olhando para o amigo, deu o dinheiro para a outra criança guardar.

Sem conseguir animar o menininho do meio-fio, peguei mais R$ 20 e deixei na sua mão enquanto ele continuava dormindo. Lhe disse, "pegue, para você voltar para casa", na esperança de arrancar alguma palavra. A outra criança disse: "o senhor tem que jogar um balde de água nele, só assim vai acordar. Mas tem que ser o senhor, senão nós vamos apanhar". E completou: "ele vai usar esse dinheiro para comprar crack".

Mais algumas tentativas de acordá-lo em vão. Felizmente as pessoas do comércio local pareceram sensibilizadas. Alguns outros passavam apressados ignorando um semelhante naquela situação.

Hoje voltei ao local e tentei procurá-lo. Não estava lá. Um aperto no coração. Mentalizei em silêncio e orei em pensamento por ele. Que tenha achado o caminho de casa. Que os anjos digam amém a todas as crianças de rua.

Que os Anjos Digam Amém ...


By Dudu Guedes

Mais um ano que se vai, mais um ano que se vem ... Sinceramente nunca fui muito bom com o natal. Apesar do clima de confraternização, sempre achei que existe um pouco de hipocrisia na data. Gente que briga o ano inteiro, mas que senta a mesa no natal como se fosse o breve intervalo de um filme. Ou gente que some e nunca se fala, e se presenteia no natal como se sentisse a obrigação social de presentear. Mas como se um presente fosse mais importante do que a simples presença.

Sem dúvida, o natal tem um significado muito bonito especialmente se mergulharmos na história da religião ... Mas acho que a mídia afastou muito a essência do seu significado. Bombardeio feroz da TV com mensagens de paz e união, mas que duram apenas 1 mês do ano. Tempo suficiente para bater as metas de vendas do final de ano.

Já o ano novo, para mim, sempre teve um caráter de renovação. Momento pré-programado 365 dias antes para avaliar os erros e acertos, sonhos e realizações. Para mim, é como um balanço da vida pessoal. E assim, faço mais uma vez a minha reflexão.

Em 2010, sofri por amor e tb fiz sofrer. Amei loucamente e sofri loucamente. Sofri sozinho num quarto escuro, me senti só no meio de tanta gente. Mas tentei influenciar positivamente a vida de tantos outros, alguns que eu nem mesmo sei o nome, e que me ajudaram com um simples sorriso. 2010 foi um ano de aprendizado pela dor. Dor que machuca e sufoca, retarda noites e dias, mas certamente traz aprendizados, cria casca, maturidade e nos faz crescer.

Aprendi a exercitar mais minha fé e gratidão. Por tantas vezes, olhei para os outros e esqueci de olhar para mim mesmo. Se 2009 foi o ano da minha dor física (operei por 2 vezes os joelhos), 2010 foi o ano da minha dor emocional. Fiquei preso no casulo dos meus tortos pensamentos e esqueci de voar.

Errei e tropecei tantas vezes. Cai e me machuquei algumas. Mas levantei (as vezes fui levantado) e continuei sem saber se continuaria. Decepções e surpresas. Mergulhei no meu eu que ainda não conhecia. Tb me surpreendi e me decepcionei. Assim foi.

Que venha 2011 ... Com mais amar. Com mais amor.

Que os anjos digam amém para os casais que se amam loucamente sem vergonha do público ... Que os anjos possam renovar e resgatar a alegria dos casais que quase não conversam num restaurante.

Que os anjos digam amém para pais que brincam com os filhos como se tivessem a mesma idade ... Que os anjos possam adocar aqueles que crêem que os melhores brinquedos são os mais caros.

Que os anjos digam amém para aqueles que vivem com simplicidade ... Que os anjos possam trazer um pouco mais de "raul seixas" para aqueles que só escutam "Bethoven".

Que os anjos protejam a saúde do povo de rua. E que tragam mais rua para o coração frio dos apartamentos.

Que os anjos digam amém para aqueles que se preocupam com nosso planeta. E que tragam mais sabedoria para aqueles que não cuidam da nossa nave-mãe.

"Não deixes que a tristeza do passado e o medo do futuro te estraguem a alegria do presente. A vida não é curta, as pessoas é que ficam mortas tempo demais. Por isto, temos que fazer da passagem do tempo uma conquista e não uma perda".


Obrigado a todos aqueles que me proporcionaram sorriso, amor e humor. Obrigado àqueles que me trouxeram dor e aprendizado.


Que 2011 possa trazer renovação, paz de espírito, saúde, amor e sempre largos sorrisos no rosto. Que possamos cuidar melhor de nós mesmos, de quem amamos e de quem nos ama. Menos tecnologia e mais relacionamento. Menos farmville e mais olho no olho. Menos youtube e mais roda de violão. Menos carne e mais peixe. Menos sapato e mais chinelo. Menos televisão e mais cinema. Menos chuveiro e mais cachoeira. Namastê.

sábado, 18 de dezembro de 2010

Os Santos que Andam por Aí ...

By Dudu Guedes

Domingo passado, acordei com um telefonema. "Vamos pra Sampaio, Dudu, ontem estava clássico". Era o Leandro, amigo e piloto de vôo me convidando para voarmos numa rampa próxima a Niterói, mais especificamente de Saquarema. Sem titubear, me juntei a eles. Eu, leandro, Wena, Vini e Hadad. Fomos em um único carro e a prosa estava bastante divertida.

Passamos por política, wikileaks, guerra de tráfico e até vôo-livre em alguns momentos. Conversa séria, opiniões fortes, muitas vezes divergentes, mas respeitosas e leves. Até que começamos a falar de consciência e não-consciência. Uma frase do Vini me chamou a atenção: "tem muito santo por aí". Ele estava se referindo ao povo de rua que metaforicamente vivia com renúncia e mais sabedoria e felicidade do que muitos poderosos. Verdade.

E como existem poderosos, falsos poderosos. Aqueles que precisam de hierarquia para exercer poder, certamente não tem influência na própria casa. Autoridade é diferente de poder. Poder se impõe, mas autoridade se conquista. Por isso vemos tantos policiais, políticos, professores, juízes e outras tantas categorias como tanto poder, mas tão pouca autoridade. Pessoas que precisam de um título para se sentirem importantes. Um cartão de visitas que impressiona, mas um coração bem longe dos mais admiráveis.

Não gosto de fazer julgamento de valor, pois cada um sabe das suas escolhas. Mas sinceramente, nunca consegui entender babás de final de semana, que andam com as crianças ao lado dos próprios pais. Mais incompreensível ainda para meu raso pensamento são famílias que levam as babás nas viagens de férias. Tudo bem, nada contra uma lua de mel fora de época, mas então por que não deixaram os filhos com os avós ?

Mas vamos voltar aos "santos que andam por aí", como o próprio Vini mencionou. Andar pela rua e misturar-se de verdade com as pessoas é exercitar a democracia. É como compartilhar opiniões e vidas diferentes. Para mim, o povo de rua é como os olhos da própria cidade. Um registro vivo do que acontece por aí, quase que um big brother dos anônimos. Se fosse possível arquivar seus pensamentos, certamente muitos pagariam fortunas para queimar estes arquivos. Cenas de adultério, pais esbravejando com filhos, profissionais apressados. Mas também teríamos o registro de muita cena bonita, que o anonimato preservou ... Como diz a música: "um vendedor de flores, ensinar seus filhos a escolher seus amores". Salve a interpretação de Ana Carolina e Seu Jorge.

Triste é perceber como tantas pessoas ignoram a vida humana que existe ao seu lado, nas ruas, esquinas e sinais. Fecham o vidro do carro e mergulham no ar-condicionado do seu universo particular, egoísta, onde só existe espaço para preocupações pequenas e tão medíocres. Onde a medida de valor é o sucesso profissional e a conta no banco. Onde sobram polegadas na TV de plasma, mas faltam palmos e mais palmos de respeito, amor e cumplicidade.

Admiro as pessoas que enxergam a vida com simplicidade. Que precisam de tão pouco para viver, mas que vivem tanto com tão pouco. E como existem aqueles que vivem pouco com tanto ... Dizem que somos o resultado das nossas escolhas. Que em 2011 seja possível mudarmos. E seja possível fazer as escolhas merecedoras de um mundo melhor. Namastê.