quarta-feira, 9 de julho de 2014

Apagão Social



Texto por Dudu Guedes

Não tenho vergonha da seleção, nem do meu país. Mas sim vergonha da capa do Globo, do Galvão Bueno e daqueles torcedores que queimaram a camisa. Muitos criticaram o Felipão na entrevista após o jogo, poucos comentaram sobre a pergunta inoportuna e descabida do jornalista sobre uma provável dívida do treinador. Dívida, que dívida cara pálida? Ser técnico é isso aí, mostrar a cara após a derrota, e enfrentar na coletiva de imprensa um adversário ainda mais perigoso, que não teve a menor sensibilidade, ética na profissão e nenhum amor a bandeira.

Sim, perdemos feio, de goleada, 7 x 1. Placar e atuação lamentável e difícil mesmo de acreditar. Dói e incomoda, claro. Mas lamentável mesmo é a enxurrada de besteiras que se viu nas redes sociais e a falta de patriotismo de alguns. Não estou me referindo às piadas. Fazem parte, eu sei. Tampouco a vaias ou críticas. Natural, previsível e cumprem de alguma forma o seu papel dentro do estádio.

Mas vamos exercitar o bom senso e a capacidade de julgar os acontecimentos como eles são. Podemos dizer que faltou treino, esquema tático errado, desequilíbrio emocional, excesso de confiança, péssimo desempenho individual ou coletivo e muitas outras explicações. Mas dizer que é o retrato do jeitinho brasileiro, honestamente acho muito exagerado. O problema não é o desconforto com o resultado, isso é coerente. Mas atribuir o resultado a razões históricas ou culturais é no mínimo desproporcional.

Quanta balela: "foi uma vitória da competência contra a malandragem", "na Alemanha, ninguém usa boné de lado", "perdemos porque futebol no Brasil é uma opção para fugir da miséria". Pelo amor de Deus! Pára, respira, pensa. Não foi culpa dos astros, da política, da economia, da Bruna Marquezine, do joelho do fulano, do Mick Jagger, da Luciana Gimenez, nem do jeitinho brasileiro ou do carnaval. Se tivéssemos ganhado, o mérito também seria do jeitinho brasileiro, portanto não é isto que está em jogo. Quer falar mal do futebol? Tudo bem. De estádios superfaturados? Um absurdo mesmo. Mas se quiser criticar a nação que ao menos seja feito em primeira pessoa do plural porque todos fazemos parte dela e elegemos até quem está no poder.

Até sábado, as pessoas se referiam ao desempenho da seleção como o "nosso futebol", desde ontem como o "futebol deles". Mas a opinião pública e imprensa são mesmo assim. Implacáveis em qualquer lugar do mundo. Até aí, tudo bem, normal, nenhuma novidade. Mas o que incomodou mesmo não foi o apagão em campo, e sim o apagão fora das quadras, essa capacidade de se isentar das responsabilidades e rasgar a bandeira quando mais precisamos. Ontem perdemos todos. O Felipão, o Fred, Neymar, Bruna Marquezine, Laerte e outros 200 milhões de torcedores. Nada de sair do estádio. Vamos ficar juntos até o apito final. Na alegria e na tristeza, na saúde e na doença.

Exercitemos juntos o verdadeiro patriotismo. Um erro (ou muitos) não pode descredenciar todo o resto, assim como um acerto não justifica o passado. Uma eliminação de copa do mundo não pode descredenciar toda uma nação, assim como a vitória da Alemanha não justifica o nazismo ou ganhar a partida também não tornaria o Brasil um país melhor. A imprensa internacional também vai dizer que foi humilhação e realmente foi, mas como uma partida. Levantemos a cabeça e vamos nos orgulhar do nosso país. Não precisamos ganhar a Copa para exercitar o patriotismo. E isto não significa apoiar as coisas erradas, como corrupção ou falta de investimentos adequados nos setores essenciais como educação e saúde. Patriotismo é diferente de oportunismo, é reconhecer as suas origens como parte da sua história, entender por que chegamos até aqui e olhar para o futuro como oportunidade de mudança. É amar a própria terra e a própria gente, ainda que exista burocracia, desigualdade e corrupção.

Sim, somos brasileiros e comemos bananas. Mas também feijoada, pão de queijo e brigadeiro. Somos um povo misto na origem e na cultura. Conhecemos blues, ouvimos jazz, tocamos rock, mas também criamos o funk, dançamos o samba, batucamos o axe, cantamos MPB e inventamos o carnaval. Somos de maioria católica, rezamos o pai-nosso e celebramos o natal, mas na duvida deixamos no ano-novo flores como oferenda a iemanja.

Sim, celebramos o por do sol e choramos no hino nacional. Choramos também em programas de TV e ao descascar cebola. Vaiamos a torcida adversária, xingamos a presidente, mas também aplaudimos o time derrotado. Mesmo com a vitoria, aprendemos que na derrota também se fazem grandes campeões, como na atitude de David Luiz com o jovem mas não juvenil jogador colombiano que já entrou para a historia. Tivemos o nosso Willian Wallace nos campos e temos muitos heróis anônimos pelas ruas.

Por vezes, temos dificuldade de enxergar a beleza por trás das cortinas do sutil. Fechamos a janela e banalizamos o que realmente importa. Como num campeonato onde venceria o melhor, mas nem sempre ganha o mais merecedor. Importante mesmo é seguir as próprias convicções, lutar pelas próprias crenças sem abrir mão dos próprios valores.

Ontem vivemos mesmo um apagão. Não só em campo, mas também fora das quadras, desses que vemos de quatro em quatro anos durante as eleições, com o total descaso e completa falta de engajamento nas causas coletivas. Fácil sair do estádio e esconder a bandeira quando a situação não lhes é favorável, difícil mesmo é manter a firmeza e proa na turbulência. Isso é para poucos. Sim, faltou mesmo estrutura emocional dentro do campo, mas também faltou para quem assistia e queimou a bandeira.

Como bem definiu um sábio amigo, temos milhares de "torcedores de ocasião", desses que empunham a bandeira nas vitórias e se escondem atrás das derrotas. Talvez também sejam pais de ocasião, maridos de ocasião, filhos de ocasião, profissionais de ocasião. Não deveriam se chamar torcedores, mas sim festejadores. Torcer é gritar, empurrar e até vaiar. Abandonar a guerra (mesmo sabendo que ela está perdida) é para quem não sabe torcer e apenas festejar.

Vou lembrar para sempre da eliminação histórica. Mas também vou guardar os pênalties que o Julio Cesar defendeu, da raça e generosidade do David Luiz, do gigantismo do Thiago Silva, da criatividade do Neymar, da liderança do Felipão e até do gol do Fred. Essa é sim a minha seleção e o meu país. Não troco de camisa por causa de um 7 x 1.

Hoje acordei triste sim. Mas continuo sendo brasileiro, com muito orgulho e com muito amor.

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Sobre a Beleza Mística das Mães


Texto por Dudu Guedes

Meu pai que me perdoe, mas nada se compara a beleza natural e quase mística das mães. Superpoderes concedidos no momento da gestação, imagino. Pode ser meio chato para os filhos e um pouco exagerado para os pais, eu também acho. Mas precisamos reconhecer: elas sabem o que estão fazendo ...

Duas horas da tarde, eu nem estava chorando e lá veio ela com a mamadeira em punho. "Mas ele acabou de almoçar", papai tentou em vão argumentar. "Ainda está com fome, vai logo", orientou a mamãe de forma imperativa. Foi quando percebi que ela entendia o que eu queria. Em poucos segundos, devorei a mamadeira e pude finalmente hibernar naquele restaurante barulhento. Esse é o poder da telepatia.

De madrugada, ela se levantou subitamente. "Aonde você vai?", ouvi de longe o papai perguntando. "Ele está com frio", respondeu. "Mas está calor", papai sussurrou baixinho pra não me acordar. "Ele vai ficar gripado", retrucou enquanto corria até o meu berço para me cobrir com a manta. E dessa vez, eu nem precisei chorar. Nunca encontrei a bola de cristal dela, mas descobri que ela tem a capacidade de viajar no tempo. Esse é o dom de prever o futuro.

Mamãe tinha acabado de chegar da feira enquanto o papai tentava esconder a bagunça. Minha fralda estava quentinha e vencida há 1 hora. Mas o papai nem reparou. Tudo bem, nos divertimos bastante. Jogamos bola na sala e sem querer eu quebrei o vaso preferido dela. Sim, aquele de porcelana que ela ganhou da tia Marli no casamento deles. Papai escondeu na cozinha. Era o nosso segredo, ele me disse antes da mamãe chegar. Fui tentar disfarçar e sorri pra ela. Ainda na porta, mamãe gritou: "já trocou a fralda dele? Cade o vaso da sala?". Descobri que era impossível tentar esconder alguma coisa dela. Esse é o poder da adivinhação.

Na escolinha, eu brincava de pique-pega. Éramos cinco crianças e corríamos de uma forma meio descontrolada de um lado para o outro. Foi quando avistei Marina e tentei usar meus superpoderes para voar até a mesa dela. Não funcionou. Cai no chão, enquanto meus amigos riam de mim. Chorei até mamãe chegar. Quando ela chegou, me abraçou tão forte que eu quase morri sufocado. Mas me senti seguro e protegido naquele lugar quentinho e aconchegante. Foi quando aprendi que o melhor lugar do mundo para se estar era no abraço da sua mãe. Esse é o dom do instinto materno.

Reconheça, game over para voce, papai. Pelo menos por um tempo, é bom você se acostumar. Agora vc terá de dividir a sua mulher com a mãe do seu filho. Curioso, são a mesmo pessoa, eu sei, mas o tempo é um só. E por enquanto, esse tempo é meu. Tá bom, eu sei que só cheguei agora, não vou sentar na janela. Vou no banco de trás e ela vai comigo. Fica tranquilo brow, eu também sou um pedaço de você. E cuidar de mim é como reafirmar o amor dela por ti, acredite.

Esse texto é para todas as mães, mulheres e filhos. Mas é acima de tudo uma homenagem a ela, que sempre achou que não tinha feito o bastante, mas nunca entendeu que fez muito mais do que eu esperava. Obrigado, minha heroína. Amo vc para sempre, mais do que ontem e menos do que amanhã.

quarta-feira, 2 de abril de 2014

Quando um sorriso lhe sorri



Texto por Dudu Guedes

A cada manha, a cena se repete. Como no capitulo de uma novela que conta todos os dias a mesma historia. Mas desta vez, uma historia do bem. Sem culpa, helenas ou assassinatos. E lá estou eu como protagonista deste enredo cotidiano. Que nada! Caio na real. Sou apenas um mero coadjuvante, ou melhor, figurante desta historia. A cena é dela. Não sei o seu nome, mas pouco importa.

08:45 da manha. Sinal vermelho na rua santa clara. Piso no freio e paro. Uma fila de meia dúzia de carros está na minha frente. Todos com o vidro fechado. O sol do pleno verão carioca anunciava um novo dia quente. Com alguns exemplares do jornal matutino debaixo do braço, ela anda diariamente por entre os carros. Sorriso no rosto, mão esticada, olho no olho, ela me entregou o jornal, lançou um autentico e sonoro "ooootimo dia" e seguiu adiante. Pouquíssimos segundos de interação, mas suficientes para revelar a beleza de sua alma. Cada janela aberta parecia como mais um objetivo cumprido. Sua meta não era entregar jornais, mas sim aquecer a manhã com um bom dia daqueles contagiantes que ecoam por minutos e irrigam o ambiente com paz e harmonia. Foi assim que ela passou a fazer parte diariamente da minha vida. Com duas simples palavras. E um sorriso.

Frequentemente levamos a vida como se fossemos os jogadores de uma partida de futebol. Precisamos convencer, agradar, buscar uma aceitação externa quase como uma absolvição do juízo final. A plateia é grande, e não basta um simples sorriso. Queremos aplausos de pé e coros de bis. Tentamos agradar a esposa ou marido, filhos e filhas, o chefe, o irmão ou a irmã, sobrinhos, amigos. Claro, é sempre gratificante ter a aceitação daqueles que amamos. Significa que somos compreendidos, aceitos e garantimos a euforia do pertencimento. Cada um escolhe sua melhor arma nesse campeonato do bem. A esposa que capricha no jantar ou o marido que traz a sobremesa. Nao importa, pois o amor é mesmo contagiante e nos faz pessoas melhores.

Entretanto, por vezes, creio que falta mais espontaneidade em nossas ações. Deveríamos simplesmente fazer pelos outros e nao para os outros, a exemplo da moça do sinal. Parece igual, mas não é. Quando fazemos por alguém, deixamos de lado nosso desejo egoísta de receber algo em troca. Quando fazemos para alguém, estamos alimentando inconscientemente nosso ego. Lá na frente, em algum momento o sinal dispara, requisitando de volta o favor, a atenção ou o carinho despejado. Não funciona bem assim. Ora, claro que que é bom receber o reconhecimento das nossas ações, especialmente quando vem devolvido em forma de amor. Mas por vezes esquecemos que o amor tem formas e embrulhos diferentes. Cada um com a sua historia, o que nos faz unicos na maneira de ser, pensar, agir e principalmente sentir.

Quando se trata de sentimento, pode esquecer a lógica das ciências exatas. Emocao nao esta no mesmo plano da razao. Ainda bem, pois permite que cada uma cumpra bem o seu papel. Gracas a emocao, ainda nao nos tornamos robôs. E gracas a razao, ainda nao nos matamos uns aos outros. O pragmatismo e a subjetividade andam juntos e harmoniosamente. Enquanto um busca o caminho mais rapido, o outro trata de aproveitar a paisagem.

Na praia a sofia dizia para o pai: "venha, está chovendo e eu vou te proteger" (enquanto carinhosamente puxava o pai para debaixo da barraca). Sincera, Sofia era como filha e mãe naquele momento. Como toda mulher, mesmo sendo criança, já levava no coração seu instinto materno de proteção. Mas era genuína e pura na sua forma de regar o amor.

Admiro pessoas de bem com a vida. Daquelas que sabem colocar ponto de exclamacao na sua rotina. Daquelas que fazem isso de graca, emanando energia vital de dentro para fora. Daquelas que genuinamente se emocionam com o por de sol dentro do palco do seu dia a dia e sem a necessidade de mudar de país para desfrutar do usual.

Elegancia para mim é simplicidade voluntaria onde ter pouco não significa escassez, mas apenas focar naquilo que realmente importa. Deixemos a hipocrisia de lado. Ganhar dinheiro não é pecado, mas melhor ainda é saber emprega-lo de maneira equilibrada, entendendo que o suficiente é sempre melhor do que o exagero. Que possamos ter menos robocops nas cidades e mais sorrisos sinceros em nossos semaforos. E quando um sorriso lhe sorrir, aproveite, com a sensibilidade de nunca quebrar essa corrente do bem. Amém.

O Prazer de Esperar



Texto por Dudu Guedes

Recentemente, o conhecido fotografo Sebastião Salgado declarou: eh preciso descobrir a beleza de saber esperar. Ele se referia ao processo de fotografar. Sentir o ambiente e se conectar junto dele, como um lobo aguardando sua presa. Pode ate ser que ela não apareça, mas você esta ali, imóvel, camuflado, quase imperceptível. Sua respiração e seu coração estão harmoniosamente ajustados com os barulhos da natureza. Não importa quanto tempo dure ou o que virá, você se rendeu aos caprichos da natureza e aceitou que é apenas mais um, parte integrante (e não a mais importante) dela.

Na vida também é assim. Somos acostumados a controlar o mundo a nossa volta com um controle remoto. Se sentimos frio, apertamos um botão e ligamos o ar condicionado. Se o silencio incomoda, mais um "click" e ligamos a televisão (assim como no filme que leva o mesmo nome, mas desta vez a ficção imitando a vida real). Queremos a distração absoluta, pois o vazio é um lugar frio, desconhecido e perigoso. E quem quer correr o risco de entrar em contato consigo mesmo? Melhor passar a quarta marcha e acelerar. Nada de reduzir no sinal amarelo. Vivemos um mundo que tem pressa. Mas pressa para chegar aonde? Misturamos o "uísque com água de coco" e mais algumas doses de ansiolitico e assim parecemos a salvos da condenação. Balela. Tentar fugir da consciência é como aprisionar a própria alma no calabouço das emoções. Melhor aceitar e esperar. Reconhecer que o tempo é uma medida relativa e não pode ser medido pelo relógio do seu pulso. E entender que 5 minutos pode ser uma eternidade para uma noiva prestes a entrar no altar ou nada para um time que esta quase perdendo o campeonato.

Saber esperar é talvez o maior exercício de humildade, quando nos percebemos na condição de frágeis criaturas do criador. Hora de entregar e exercitar a fe e aceitacao de que nao estamos no controle. Entender que mesmo quando se é piloto, nao controlamos totalmente o percurso. Claro, sempre temos a liberdade de escolher o trajeto, mas o sinal pode fechar ou o pneu furar no meio do caminho. Melhor relaxar, dobrar as mangas e curtir a vida com olhos de observador e aprendiz. Alguém já disse que o melhor da festa eh mesmo se preparar para a festa.

Sebastiao Salgado adverte: para ser fotografo, eh preciso ser paciente. A sabedoria revela que para viver também. E paciência não eh sinônimo de passividade, devemos sim assumir as rédeas das nossas escolhas e caminhar na direção delas. Mas também reconhecer que uma boa decisão não depende do resultado final, mas sim do aprendizado e crescimento gerado. Que a vida possa nascer leve para quem tem pressa e que a pressa se transforme na beleza de saber esperar. Entender que o futuro se constrói do presente, mas que o caminho também se faz do caminhar. Afinal, a vida eh um simples acontecimento e parafraseando o poeta "Deus não demora, Ele simplesmente capricha".

sexta-feira, 28 de março de 2014

Quando a Idade Chega


Texto por Dudu Guedes

Quando a idade chega, você percebe que seu olerite não representa muita coisa. Que menos as vezes representa mais. Que aquele carro hidramático parado na garagem já não faz mais sentido. E que nem adianta reclamar na sunab, pois o mais importante é o que você faz e não o que os outros dizem.

No meu tempo, uma camisa supimpa valia mais do que uma foto de perfil e mensagem instantânea era ligar para o teletrim. Você descobre que não precisa mais ir a discoteca para conquistar uma broto legal. E percebe que esta macaco velho para tudo isso e já começou a trocar as bolas com tantas atualizações do ias (ops) ios, uatizap e faicibuqui.

Que novela boa era de rei ou rainha ou uma gata que comeu. Que trapalhões eram quatro e não uma turma. No meu tempo, a expressão "dar uma espiadinha" era olhar pela fechadura, seguro era estar dentro de casa e o perigoso era mesmo aceitar bala de estranho na rua. Corretor de texto era magic paper, comida de avião não era barra de cereal, telefone fixo era patrimônio familiar declarado no imposto de renda e sorte no natal era ganhar um bicicleta BMX (cecizinha para as meninas) ou uma morey-buggie.

Voce percebe que precisa rever seus conceitos quando seu pai escreve "VQV" no facebook e vc não tem a mínima ideia do que significa. Depois ele explica "VQV, Vamos Que Vamos, meu filho". Sua mãe te manda S2 por mensagem e você acha que foi erro de digitação. Então você pensa que pode ser o nome de um remédio e decide ligar para ela, mas depois você ainda tenta disfarçar quando descobre o significado. Outro dia vi uma postagem "BFF, SQN". Pensei que fosse sigla de endereço de Brasilia: "Setor Sul, Quadra Norte". Depois me explicaram: "Best Friends Forever, Só Que Não". PAD. Acabei de inventar esse: "Pelo Amor de Deus". Difícil, né?

Quando a idade chega, é melhor nao duvidar. Deixe o all star no armário, pendure a mochila da company no cabideiro e trate de sacudir o esqueleto. Não adianta ficar grilado. Afinal, idade não se mede pelos anos que se passaram mas pelo que vc ainda quer viver.

terça-feira, 11 de março de 2014

Sobre Ego e Redes Sociais

Texto por Dudu Guedes

Recentemente um amigo compartilhou uma historia no bar. Do seu lado, um casal conversava. Olhos atentos ao celular, um deles comemorava em alto e bom som: " meu recorde! Olha esta foto, mais de 150 likes!". Do outro lado da mesa, a menina desolada falou baixinho: "É ... muito bom mesmo. Minha melhor foto não passou de 80 likes". Curioso como o indicador de felicidade ou sucesso se resumiu a uma simples curtida. Tempos atuais, mas perigoso.

Confesso que sou um usuário frequente de redes sociais, mas observo com ressalva a manifestacao de alguns que usam o facebook como se fosse uma edicao particular da revista caras. Sindrome do narciso que usa a midia para gritar sua vida ao mundo como um outdoor pessoal. Nao aguento mais auto-narrações de "falsos atletas olímpicos" que todos os dias divulgam a quebra de seu recorde mundial.

Ora, a psicologia explica: estudos indicam que falar de si próprio gera um prazer equivalente a se alimentar, ganhar dinheiro, dormir ou fazer sexo. Numa conversa normal, as pessoas falam de si cerca de 30% do tempo, enquanto nas redes sociais este índice sobe para 90%, com possibilidade de um feedback instantâneo. Isso gera inconscientemente uma sensação de prazer instantâneo, mas que não é duradouro.

A partir dai, pode se iniciar um comportamento patológico com a tecnologia. Pesquisas internacionais apontam que já existem mais de 300 milhões de dependentes de facebook no mundo, superando o próprio alcoolismo. 3 em cada 10 usuários de redes sociais já apontam sinais de uma relação abusiva. Calma! Dependência virtual não tem a ver com o tempo em que você usa a rede, mas a uma relação a perda de controle como o desprezo das relações na vida real ou crise de abstinência com a falta de conexão.

Importante deixar claro que não sou contra a tecnologia. Pelo contrário, reconheço os benefícios que esta modernidade traz. O problema é que, quando mal utilizada, ela altera a percepção de tempo e espaço, gerando mais ansiedade ou ate depressão. A tecnologia existe para aproximar pessoas ou otimizar o tempo e não o contrario. Vejo cada vez mais gente que não sai de dentro de casa ou jamais desgruda da próprio celular mesmo nas refeições em grupo (confesso q já fiz isto). Recentemente, um amigo fisioterapeuta comentou que as crianças em seu consultório estão apresentando novos tipos de traumas, antigamente mais comum em idosos, como desvio de coluna ou lesão por esforço repetitivo nas mãos (LER). Tudo fruto de muitas horas dedicadas no tablet, celular ou computador, somada a uma postura inadequada. Para mim, soa muito estranho. Sou do tempo em que criança no ortopedista era sinal de braço ou perna quebrada em brincadeira de rua.

Dizem que estamos vivendo a era do "parecer". Durante a vida no campo, havia a valorização do "ser" onde as relações humanas eram o pilar principal e a família a instituição mais importante. Com a revolução industrial, surgiu a sociedade do consumo com foco na valorização do "ter", onde acumular bens materiais passou a ser símbolo e reconhecimento de sucesso. Com as mídias sociais, estamos vivendo um novo ciclo de transformação, onde o "parecer" tem mais importância do que propriamente o "ser" ou "ter". Não importa quem você eh, o que você faz ou o que você tem, mas principalmente o que você representa ao mundo a partir das suas postagens. Como o marido que trai e reclama da mulher, mas posta ao mundo um casamento feliz. Ou a menina que reclama da viagem no meio do mato, mas prefere postar #contatocomnaturezamomuito. Perigoso. Chega de hashtags com falsos testemunhos. Eh quando se deixa de reconhecer o que genuinamente te faz bem com a preocupação essencial de agradar aos outros. Desejo inconsciente de pertencimento para saciar tamanha insegurança ou narcisismo. Finalmente, pode marcar o "check" nas obrigações sociais. Caso típico do "verdadeiro falso" ou "falso verdadeiro".

Deve ser como a analogia de afinar um violão. Primeiro precisamos esticar totalmente a corda para só depois aliviar um pouco e achar a afinação ideal. Talvez estejamos vivendo este momento de extremo para num breve futuro encontrar a medida certa. Tomara. Fico feliz de ver iniciativas bem humoradas de empresas como a coca-cola que sugeriu recentemente a invenção de um aparelho para promover mais a interação social. Assista em: http://m.youtube.com/watch?v=Bssb1FZ_wYo

Em "rede social", quando a "rede" cai, é hora de devolver o "social" a vida real. Por um mundo com menos "eu" e mais "nós". Por mais conversa olho no olho e menos whatsapp. Por mais abraço de verdade e menos carinha feliz no celular. Por menos foto digital e mais porta retrato. E que as nossas preces possam ser ouvidas. Amém.

quarta-feira, 5 de março de 2014

Confete e serpentina

Texto por Dudu Guedes

Confesso que aprendi a gostar de carnaval. De longe. As vezes de perto. As vezes de muito perto. Impossível ficar totalmente de fora da festa quando se mora no Rio de Janeiro. Aprecio o movimento daqueles que se juntam harmoniosamente ao clima festivo da cidade. Ja encontrei palhaco, presidiário, she-ra, robocop, noiva, gueixa e ate mesmo a Dercy Goncalves decidiu aparecer por aqui. Estava bem animadinha. Pelo visto, ultimamente o ceu deve andar um pouco sem graca, a julgar pelos seus excessos. A vantagem de se fantasiar como a Dercy eh que voce ganha uma especie de altus para a folia. Qualquer exagero pode ser justificado como parte integrante da fantasia. Nesse caso, devo confessar: Dercy estava bem convincente. E vc, qual a sua fantasia? Surfista, respondi. Chinelo, bermuda, óculos escuros. Gravata no pescoço, chapéu colorido, coloquei a prancha no carro como ultimo adereço e fui pra minha escola de samba.

Na praia, o ambulante oferecia esfirra com um turbante envolto na cabeca. Seria mais apropriado se hoje ele vendesse picole ou mate leao. Disfarce perfeito do carnaval. Tudo bem, são os ossos do oficio. Imaginei a cena. Voce entra no shopping e pede informacao ao homem de terno preto parado na porta. Ele te devolve: sundae ou casquinha? Antes que voce pense que se trata de um novo código ou qualquer associação com o rolezinho, ele explica: "to aqui fantasiado de seguranca, mas sou caixa do macdonalds". Um tanto esquisito, melhor nao. Se bem que Carnaval eh mesmo da família das curiosidades. Ate o batman já tomou dura na lei seca e assoprou o tal aparelhinho. Gothan City ja nao eh mais a mesma.

Do outro lado da rua, enquanto uma legiao de noivas procurava o seu marido, a Fiona agarrou o homem aranha e desistiu do Shrek. O Shrek procurava a freira pra se consolar. A freira beijava o presidiário. A gueixa tomava cerveja de latinha, acabou o saque. A branca de neve com a barba por fazer tomava o saque da gueixa. O catador de latinhas eh aplaudido e reverenciado pela legiao no meio do bloco. Em ipanema, o "papa Francisco" se juntava as diabinhas. A princesa meio acima do peso dava um show de beleza e sambava na avenida, enquanto o incrivel huck vomitava esquecido numa esquina qualquer. Papai noel fugiu do frio e tirava umas ferias por aqui. Nem o cachorro escapou e estava fantasiado de hot-dog. E a nota dez vai pra a criancada. Bloco da alegria genuína e autentica. O superman e barbie estao em baixa. Este foi o carnaval da monster high. Monstrinhas e monstrinhos de varias cores e tamanhos. Novos simbolos e herois que surgem, mas a essencia infantil continua igual. Gracas a Deus.

O carnaval eh talvez o mais democrático dos movimentos. Eh quando se junta o operário e a burguesia. Ou melhor, quando a burguesia aplaude de pé o trabalho dos operários. Um ano inteiro de trabalho duro que se eterniza na passarela. Do mestre alas a passista.

Carnaval eh assim: meio exagerado e contraditorio. Mas uma contradicao autentica que da a liberdade de ser quem voce quiser e de criar a propria historia. Eh quando o individual parece ter mais força do que o próprio coletivo. Ja vi sapo com princesa, e sete brancas de neve com apenas um anão. Eh como um bonus do ano novo. E dizem mesmo que no brasil o ano só começa depois dele. 1 trimestre de treino ate que comece 2014. Verdade. Mas eh bom nao exagerar, pois a musica ja ensinou que todo carnaval tem seu fim e apesar de sugestivo, o mundo realmente nao acaba na quarta feira de cinzas.

sábado, 1 de março de 2014

Prova Final


Texto por Dudu Guedes
Sem nos dar conta, levamos a vida inteira enfrentando diferentes exames de classificação. Reprovado. Aprovado. 2 palavras tão parecidas, mas diametralmente opostas tanto no significado como na sua intensidade de emoções.

Muito antes de existir, já somos submetidos ao primeiro exame. No consultório, a mãe aguarda o resultado. Ao lado, um casal recebe a noticia: parabéns, será um menino. De mãos dadas, o casal se abraça e comemora. Em poucos segundos, chega a assistente para o outro casal: desculpem, não foi desta vez. O resultado do exame de gravidez deu negativo. Para o casal do lado, um alivio. Ufa, conseguimos. Mas para ela, as palavras soam com o peso de uma responsabilidade não cumprida. A profecia não se concretizou. Não foi desta vez. Foi só um treino, aquecimento. Na próxima, o time entrara em campo de verdade. Momento de gerenciar a frustração. Meses e as vezes anos se passam até receber a noticia: vc esta gravida! Parabéns! Finalmente chegou a sua vez. Champanhe, flores, cartões ou bombons. Não importa. Tinha chegado o dia D. O importante era mesmo comemorar. E esperar 3 meses para anunciar para as amigas. 9 meses se passam. Tempo necessario para uma gestação perfeita. E tempo suficiente para alimentar os sonhos e expectativas de uma nova vida. A sua vida.

É a partir dai que tudo começa. Neste instante, sem saber, você ganha sua caderneta onde registrará as notas e classificações ao longo da vida. Vc nem pediu e la vem o caderninho. Vc não tem escolha. O primeiro coco. A primeira fralda. A primeira vacina. A primeira gripe. A primeira palavra. A primeira chupeta. A primeira mamadeira. No inicio, somos café com leite do mundo. Meros aprendizes. Como coringas num jogo que não precisa de ganhador ou perdedor. Nao importa se quebramos o telefone da sala ou o porta-retrato preferido da mesa. É só dar um sorriso e esperar. Em 5 segundos, o pai e a mãe se derretem. Ok, vc ganhou. Bônus no placar. Afinal, foi você quem trouxe mais alegria e sentido para a vida deles.

Até que chega o dia de sair do berço e do carrinho. Metaforicamente, é quando a águia empurra o filhote para fora do ninho. Vc não tem escolha. Vai ter que aprender a voar. Aquele lugar quentinho e confortavel nao te pertence mais. Sem entender direito, vc despenca de uma altura de 500 metros. O chão vai chegando perto. É mesmo melhor começar a bater as asas.

Sem nos dar conta, começamos ainda criancas a colecionar uma serie de carimbos no nosso boletim. Prova de matemática básica: aprovado. Já sabe contar os dias para seu aniversario, parabéns. Pode ir brincar na casa do seu amiguinho. Prova de português: reprovado. Ainda não sabe escrever o próprio nome. Melhor caprichar ou não vai ganhar a sobremesa. O primeiro grau é quase um aquecimento. Inicio do primeiro tempo, a cobrança quase não existe. O resultado quase não é importante. Mas cuidado com nota vermelha. Ou vai repetir de ano. Quem quer abandonar a turma no meio do caminho? Nem pensar. Alerta vermelho ativado. Mas só por precaução.

Curso de inglês e aula de natação, futebol, judo ou bale. Bom para fazer amizades e desenvolver a capacidade motora e de expressão. Nenhum compromisso importante. Mas nem pense em fazer feio. Seu pai e sua mãe estão ali. Nada de afundar no meio da piscina. Pior, os pais dos seus amigos também estão ali. É bom fazer bonito para que seus pais possam exibir orgulhosos o troféu. Sim, você é o troféu deles. Egoísmo que nada! Eles dedicam tempo e dinheiro com você. Portanto, trate de fazer sua parte e reafirmar aos amigos deles o seu papel de bons pais. Trate de acertar o penalti. Mais uma estrela para a patente. Dê o seu melhor, nada de vexame heim. Afinal, vc é a personificação da família feliz. Na sua idade, seus pais já tinham muito mais responsabilidade. Você já é quase um adulto pois compra seu próprio lanche no intervalo do recreio. E nao deixe de fazer o dever de casa e dar o exemplo para o seu irmão.

Dai você entra para o segundo grau e acha que tudo vai melhorar. Chegou a hora de extravasar a libido. Finalmente vai compensar tantas horas gastas com a aula de violão. Você é quase um adulto, pois já anda de ônibus sozinho e vai as festinhas da escola. Disfarca. Nada de deixar os amigos virem teu pai te buscar. Quem quer ser o careta? Legal mesmo é o pai do joaozinho. Tatuagem na perna e piercing na orelha. Demais! O pai do joaozinho anda de moto. Será que a Marina viu? O sinal do recreio toca. Melhor esperar a turma da primeira fila subir. A onda é esperar um pouco no pátio e chegar na sala depois do professor. Chegou a fase da rebeldia. Questionar as regras e criar as suas próprias leis. É bom não contrariar. Para ganhar o respeito da turma, é preciso ter atitude. Atitude? Contradição difícil de entender. Ganhar o próprio respeito com o desrespeito alheio. Seus pais desolados tentam te explicar em vão. "Calma, joaquim. É só uma fase, vai passar", alertam os especialistas.

Esta chegando o vestibular. A tal frase "o que você quer ser quando crescer" vai se aproximando de você como uma profecia prestes a se concretizar. E o pior, você não tem a mínima ideia da resposta. Finalmente, uma luz parece se acender dentro dessa cabeça vazia. Ufa, encontrei a resposta. Engenheiro. Mas tem muito homem em engenharia. Vou ser medico como meu pai. Ou advogado como minha mãe. Melhor, arquiteto como o pai do joaozinho! E ainda vou de moto pra faculdade. Estuda, meu filho, estuda que você consegue a federal. Olha lá, o Marcelo já tirou a carteira de motorista. Para você, ainda falta uma eternidade. 3 meses pra completar 18 anos. Ah, quando a Marina me vir de carro! Calma, sua hora vai chegar. Concentra no vestibular!

1 ano depois, você começa o primeiro estagio no fórum. Apertado esse nó da gravata heim. Nessa hora, o joaozinho deve estar de bermuda desenhando no pilotis. E cheio de menina no curso de arquitetura. Tudo bem, foco. Procura o corredor ... ah lá está a sala certa. "Em que posso lhe ajudar doutor?", perguntam pra você. A cabeça embaralha. E dá um nó maior do que o da sua gravata. Você olha pra trás e procura um médico. Não tem ninguém. É isso mesmo, é com você. Deve ser o palitó novo. Impressionante. Em poucos meses, você ganhou a mesma patente do seu dentista de 53 anos de idade com especialização em Harvard. "Ah, se a Marina tivesse aqui", suspira.

Finalmente, você passa a ter o seu dinheiro. E sua independência. E sua liberdade. Pode decidir pra onde viajar no carnaval e não se preocupa em voltar tão cedo pra casa. Mas também ganha junto a conta da gasolina, o IPVA, o aluguel, a luz, água, telefone e internet. Ninguém te perguntou se você queria isto. Mas foi você que escolheu. Os especialistas advertem: crescer dói e é irreversível. 06:45, o seu cafe da manha é um cachorro quente na loja de conveniência mais próxima da sua casa. Seu pai te encontra indo pra corrida matinal e balança a cabeça como um sinal de reprovação. "Ah se a marina te visse assim heim", metralha o pai. Você pensa em reagir, mas esta sem forcas. Melhor admitir que perdeu esta batalha. Você se sente um fracassado e joga a latinha de cerveja na cesta de lixo mais próxima.

Depois você cresce, casa e tem filhos (a marina não foi a mãe deles). Não necessariamente nesta ordem. Muitos tem filhos, casam e só depois crescem. Tudo bem. Certa vez ouvi: a vida é um simples acontecimento. Verdade, eh preciso deixar fluir. Mais humildade, mais fé e menos controle. Vamos deixar a cortina aberta para o sol entrar. Mas isto não significa passividade diante das escolhas. Você escolhe, você decide, mas precisa reconhecer que não controla totalmente o resultado final. E o erro ou acerto de uma decisão não se baseia necessariamente no fim e sim no caminho percorrido e no seu aprendizado. Muitos casam e depois se separam. Alguns escolhem um novo emprego e acabam desligados da empresa. Tudo bem. Calma, amanha será um novo dia. Que tenhamos a sabedoria de persistir e enfrentar as turbulências, mas também a humildade de entender quando um ciclo termina. A próxima térmica sempre está mais a frente da descendente.

Agora você tem o comando da sua vida. Ou acha que tem. Passou a ser pai e mãe de si mesmo, pai ou mãe de seus filhos e também pai ou mãe de seus pais. A responsabilidade parece pesada demais para você. Uma coluna só carrega o peso do próprio corpo, alertam os ortopedistas. Da vontade de retirar o fardo e voltar a ser criança. Não dá. Seu filho esta na sala sorrindo para você. E tudo que fizer será usado contra você mesmo. Tentara evitar certos exageros da sua infância, mas será em vão. Agora é a sua vez de entregar o caderninho para seus filhos. E sem se dar conta, tentara compensar com ele toda a frustração do seu passado. E desde já, juntara o dinheiro para ele fazer aquela viagem de intercambio que voce nao fez. Tudo bem, é por uma boa causa. Ele começa a namorar a sabrina no colégio e vai te pedir para ficar. Ele nao quer passar 1 ano na Australia e abrir mão de seu amor. Vc vai contar sobre a Marina e explicar que também teve uma paixão adolescente, e que tudo isso é passageiro. Quem sabe? Vai dizer que ele esta tendo uma oportunidade que você nunca teve e deveria aproveitar; que na Australia ele ira conhecer muitas outras sabrinas e marinas, e bla bla bla. Nao deixa de ser verdade, mas ...

Claro que moldamos nossos pensamentos e ações a partir de nossas experiências, mas por vezes é preciso entender que cada um carrega no pulso o próprio relógio. Não tem problema em ajustar os ponteiros da família, mas não se pode simplesmente impor o proprio horario de verao. Por vezes, eh necessario relativizar a perspectiva e enxergar pela lente dos outros. E ceder eh sempre um bom exercicio de humildade, desde que seja feito com o coracao.

Seu filho vai crescer, você vai envelhecer e ele passara a cuidar de voce como o seu pai. Voce vai dizer que ele trabalha demais, que deveria aproveitar mais a vida e levar as coisas menos a serio. E de repente, aquele que vc sempre chamou de filho passara a ser chamado tambem de pai. Chegara a sua hora de ser avo. Voce percebe que gastou tempo demais com coisas inuteis e finalmente conseguiu pendurar o fardo no armario. Nao tem jeito, mais um ciclo que recomeca. Voce descobriu que dinheiro eh importante, mas apenas o suficiente para usufruir as boas coisas da vida. E maioria delas eh mesmo de graca. Nao adianta tentar explicar. Sera preciso evoluir e aprender com os proprios erros e acertos e encontrar as proprias marinas ou sabrinas pelo caminho. Cada um na sua trajetoria particular, mas com a unica certeza de que esta linha nao eh uma reta. Melhor aproveitar a estrada. E boa viagem!

Se chegou ate aqui, assista o video: http://www.youtube.com/watch?v=qmdj1ucfOaY