terça-feira, 11 de março de 2014

Sobre Ego e Redes Sociais

Texto por Dudu Guedes

Recentemente um amigo compartilhou uma historia no bar. Do seu lado, um casal conversava. Olhos atentos ao celular, um deles comemorava em alto e bom som: " meu recorde! Olha esta foto, mais de 150 likes!". Do outro lado da mesa, a menina desolada falou baixinho: "É ... muito bom mesmo. Minha melhor foto não passou de 80 likes". Curioso como o indicador de felicidade ou sucesso se resumiu a uma simples curtida. Tempos atuais, mas perigoso.

Confesso que sou um usuário frequente de redes sociais, mas observo com ressalva a manifestacao de alguns que usam o facebook como se fosse uma edicao particular da revista caras. Sindrome do narciso que usa a midia para gritar sua vida ao mundo como um outdoor pessoal. Nao aguento mais auto-narrações de "falsos atletas olímpicos" que todos os dias divulgam a quebra de seu recorde mundial.

Ora, a psicologia explica: estudos indicam que falar de si próprio gera um prazer equivalente a se alimentar, ganhar dinheiro, dormir ou fazer sexo. Numa conversa normal, as pessoas falam de si cerca de 30% do tempo, enquanto nas redes sociais este índice sobe para 90%, com possibilidade de um feedback instantâneo. Isso gera inconscientemente uma sensação de prazer instantâneo, mas que não é duradouro.

A partir dai, pode se iniciar um comportamento patológico com a tecnologia. Pesquisas internacionais apontam que já existem mais de 300 milhões de dependentes de facebook no mundo, superando o próprio alcoolismo. 3 em cada 10 usuários de redes sociais já apontam sinais de uma relação abusiva. Calma! Dependência virtual não tem a ver com o tempo em que você usa a rede, mas a uma relação a perda de controle como o desprezo das relações na vida real ou crise de abstinência com a falta de conexão.

Importante deixar claro que não sou contra a tecnologia. Pelo contrário, reconheço os benefícios que esta modernidade traz. O problema é que, quando mal utilizada, ela altera a percepção de tempo e espaço, gerando mais ansiedade ou ate depressão. A tecnologia existe para aproximar pessoas ou otimizar o tempo e não o contrario. Vejo cada vez mais gente que não sai de dentro de casa ou jamais desgruda da próprio celular mesmo nas refeições em grupo (confesso q já fiz isto). Recentemente, um amigo fisioterapeuta comentou que as crianças em seu consultório estão apresentando novos tipos de traumas, antigamente mais comum em idosos, como desvio de coluna ou lesão por esforço repetitivo nas mãos (LER). Tudo fruto de muitas horas dedicadas no tablet, celular ou computador, somada a uma postura inadequada. Para mim, soa muito estranho. Sou do tempo em que criança no ortopedista era sinal de braço ou perna quebrada em brincadeira de rua.

Dizem que estamos vivendo a era do "parecer". Durante a vida no campo, havia a valorização do "ser" onde as relações humanas eram o pilar principal e a família a instituição mais importante. Com a revolução industrial, surgiu a sociedade do consumo com foco na valorização do "ter", onde acumular bens materiais passou a ser símbolo e reconhecimento de sucesso. Com as mídias sociais, estamos vivendo um novo ciclo de transformação, onde o "parecer" tem mais importância do que propriamente o "ser" ou "ter". Não importa quem você eh, o que você faz ou o que você tem, mas principalmente o que você representa ao mundo a partir das suas postagens. Como o marido que trai e reclama da mulher, mas posta ao mundo um casamento feliz. Ou a menina que reclama da viagem no meio do mato, mas prefere postar #contatocomnaturezamomuito. Perigoso. Chega de hashtags com falsos testemunhos. Eh quando se deixa de reconhecer o que genuinamente te faz bem com a preocupação essencial de agradar aos outros. Desejo inconsciente de pertencimento para saciar tamanha insegurança ou narcisismo. Finalmente, pode marcar o "check" nas obrigações sociais. Caso típico do "verdadeiro falso" ou "falso verdadeiro".

Deve ser como a analogia de afinar um violão. Primeiro precisamos esticar totalmente a corda para só depois aliviar um pouco e achar a afinação ideal. Talvez estejamos vivendo este momento de extremo para num breve futuro encontrar a medida certa. Tomara. Fico feliz de ver iniciativas bem humoradas de empresas como a coca-cola que sugeriu recentemente a invenção de um aparelho para promover mais a interação social. Assista em: http://m.youtube.com/watch?v=Bssb1FZ_wYo

Em "rede social", quando a "rede" cai, é hora de devolver o "social" a vida real. Por um mundo com menos "eu" e mais "nós". Por mais conversa olho no olho e menos whatsapp. Por mais abraço de verdade e menos carinha feliz no celular. Por menos foto digital e mais porta retrato. E que as nossas preces possam ser ouvidas. Amém.

Um comentário:

  1. Belas palavras Edu! Estamos na geração do "zap zap". Onde uma "simples" ligação, ou uma conversa olho no olho por alguns "longos" minutos, viraram prova de amor.

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