segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

"Mais solitario que um paulistano"


Dia 10 de dezembro, quinta-feira chuvosa. Uma chuva fina que parece um manto permanente que encobre Sao Paulo. Nao importa a estacao, com alguns intervalos de sol, a garoa volta a dominar a capital e honrar o nome que a acolheu ...

Neste dia, acordei antes das 06 da manha, com o despertar do quero-quero. Na vespera, junto com o amigo Souzinha, decidimos dormir na sua casa de praia da jureia, litoral norte, a cerca de 200 km de Sao Paulo. Saimos da capital na quarta a noite. Chegamos 2 horas depois, as 23h, sob insistente chuva, mas que nao foi capaz de tirar nossa vontade de um banho de mar. Batizada de "casa do tarzan", a mesma ficava suspensa no terreno, praticamente junto as arvores.

Muito agradavel, o local era ecologicamente correto, um projeto que utilizava bambus em sua construcao, arejado, sem muitas janelas, e aproveitando o potencial dos ventos e luz natural ... Pretendo me aposentar em um lugar parecido ...

O barulho da chuva se misturava ao cantarolar dos grilos ... Conhecida a casa, colocamos a sunga e partimos para um banho de mar. Pes descalcos na areia molhada, praia deserta, chuva fina ... Pareciamos 2 criancas perdidas em um parque de diversoes abandonado. O sorriso estampava nossa alegria e criava uma cumplicidade mutua de compartilhar aquele momento. Nao era preciso sequer dizer uma palavra, o mar parecia abencoar aquela noite e renovar as energias.

Depois de 1 hora de uma boa prosa com o amigo, resolvi dormir. Dormi como uma crianca ouvindo ao vivo a trilha de "Sons da Natureza". Tinha esquecido o quanto isto eh realmente bom.

No dia seguinte, quinta-feira, acordei ao som dos quero-queros e ouvi o barulho de um insistente passarinho. Um assobio que parecia nao cessar, e logo descobri que vinha da varanda, do lado de fora do quarto. Era o souzinha, de prancha na mao, esperando para o surf matinal. 06 da manha, caminhamos por menos de 5 minutos ate chegar na praia. Deserta, sob fina chuva, e apenas nos 2, escolhendo as ondas.
Cabeca-feita, voltamos para Sao Paulo, sentido praia-trabalho. Voltamos ouvindo o mestre armandinho e cumprimentando as pessoas que cruzavamos. 1,5 hora de atraso muito bem planejado e sabiamente decidido.

O dia passou rapido, produtivo, e nao percebi nenhum sinal das poucas horas de sono.
18:00, ja estava na hora de eu ir a um evento ... Era o lancamento de um programa de responsabilidade social de um parceiro para fomentar a consciencia da familia sobre os perigos da internet, educando os nossos filhos. Um motivo nobre, pensei.
Passei em casa para colocar o terno, ja atrasado. Nao tem jeito, nossa sociedade eh cruel. Eh necessario pendurar uma gravata no pescoco para parecermos importantes e impor respeito. O evento comecaria as 19:00, e na sequencia, tinha convidado os professores da natacao, Paulo, Henrique e Ju, para comermos um peixe em casa por volta das 21:30. A academia iria fechar por uma obra do metro, e resolvi prestigia-los em nome da amizade que tivemos.
O evento estava cheio, muito formal, era uma coletiva de imprensa com a presenca de importantes pessoas do setor. Quase 2 horas de atraso, fomos convidados a entrar no salao principal, apos um teatro muito bem encenado no coquetel.
Fui convidado a compor a mesa, pois representaria a empresa na qual trabalho, ao lado de pessoas importantes como Ziraldo e representantes de outras instituicoes. O evento estava muito bem produzido, e como ja disse, uma causa-social muito nobre de educar e instruir a sociedade. O simbolo do projeto eh o menino maluquinho, figura escolhida para tratar do tema e explicar a familia sobre os reais perigos da internet. Fui convidado a falar, assim como os demais presentes. Tudo muito formal, e muito bem orquestrado. Certamente atendeu o proposito do evento de reunir jornalistas e divulgar o projeto. Criou impacto.
Meu celular comecou a vibrar, mas nao podia atender. Estava na mesa, diante de uma plateia de jornalistas, enquanto do meu lado, o Ziraldo se pronunciava ... Uma cara simpatico, intenso e verdadeiro, que fala com o coracao, o que pra mim, explicou muito do seu sucesso. Mas eu confesso que na minha cabeca, so lembrava do meu compromisso ... No relogio dele pude ver o horario e vi que ja estava perto das 22:00 ... Vi que era o Henrique que estava me ligando ... Tinha combinando de busca-los as 21:30 na saida da natacao. Disfacando, consegui escrever uma mensagem: estou atrasado, evento do trabalho, me esperam ou remarcamos ?
Compreensivos, o Henrique devolveu: trampo em primeiro lugar, relaxa, nao se preocupa, depois remarcamos. Fiquei aliviado, mas confesso que nao fiquei satisfeito. Me senti como num daqueles filmes de Hollywood. Lembrei de uma frase: sucesso eh tudo que vc renuncia para chegar ate onde esta. E percebi concretamente o que estava renunciando. E torci para que o Ziraldo terminasse rapido. Coitado, o cara eh especial, mas eu queria mesmo tirar a gravata, fazer um peixinho na brasa, e jogar conversa fora com os amigos. Dar uma forca para pessoas tao especiais que me ajudaram na recuperacao da minha cirurgia e agora precisavam de meu apoio. Cultivar uma amizade, que confesso, nao foi facil encontrar em Sao Paulo. E pensei em quantas outras coisas tao importantes tb estaria renunciando na minha vida. Fui tomado por uma sensacao ruim e vontade de largar tudo. Lembrei do filme do controle remoto (como eh mesmo o nome?), sera que eu estaria acelerando a minha vida ? Lembrei de outra situacao em que recebi o carinho e amor de uma das pessoas mais especiais da minha vida.
Terminado o evento, peguei o carro para voltar para casa. Me perdi e fui parar em uma iluminada rua, decorada com luzes de natal. Muitas lojas de marcas, nao demorou e percebi que estava na tal da Oscar Freire. Por engano, acabei conhecendo a rua considerada a mais chique da noite de Sao Paulo. Bonita, mas longe do meu destino final (minha casa) e nem de longe se tornaria minha opcao de programa de fim de semana. Prefiro um chinelo de dedo e passear pelo arpoador ou mesmo pela vila madalena.
Mais alguns minutos perdidos, e ja perto da meia noite, resolvi parar em um posto de gasolina para jantar.
Sentei na loja de conveniencia e comi 2 cachorros-quentes, um doritos e um guaraviton. Sim, tinha guaraviton ! Mas isso, nao me fez sentir mais perto do Rio de Janeiro. Pelo contrario, parecia uma imersao em Sao Paulo. Uma cidade que nao dorme. Depois da minha "refeicao", fiquei congelado, como um mero espectador ... Em 10 minutos, entraram mais de 10 pessoas na loja ... Gente que se esbarra, mas nao se olha. Gente com o cabelo bem arrumado, mas que nao diz obrigado.
Lembrei da minha manha abencoada na praia. Que contraste. Lembrei tb do sabio Zeca Baleiro e da letra de sua musica: mais solitario que um paulistano.
Viva o Ziraldo. Mas tambem viva o Souzinha. Viva a jureia. Viva Netuno. E viva a casa do tarzan.

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