sábado, 2 de janeiro de 2021

Professor Covid

Texto escrito por Dudu Guedes

Olá professor. Essa carta é um agradecimento dos seus alunos aos ensinamentos que você nos deixou. Foi um ano duro e de muito aprendizado. 
Confesso que por vezes questionei os seus métodos. Os fins não podem justificar os meios. Muita gente sofreu com a perda de familiares ou amigos queridos. Eu perdi 2 avós neste ano. Mas reconheço que esta pausa forçada que vc nos impôs trouxe a saudade do que nunca valorizamos. Sentimos falta dos abraços e do calor humano. Trocamos as lentes da rotina pelo olhar do novo. Passamos a valorizar o essencial. De que adianta ter se não podemos ser. Transformamos nossos lares em um refúgio seguro para reconectar laços de intimidade com pessoas próximas que as vezes pareciam tão distantes. Sei que tiramos nota zero em 2019 e repetimos de ano em 2020. Mas agora chega. Demos duro. Sofremos. Ralamos. Seus ensinamentos ficarão para sempre, mas agora precisamos seguir adiante. Pode ir embora e a gente seguirá por aqui. Mais firme, mais confiante e com brilho no olho de quem repetiu de ano mas aprendeu a lição. Que assim seja. Amém.  



domingo, 10 de maio de 2020

Meu Primeiro Confinamento

Texto por Dudu Guedes

Mês 1 - No meu primeiro confinamento, eu não recebi máscara, nem álcool gel. Mas você me protegeu para eu não ficar doente.

Mês 2 - No meu primeiro confinamento não existia ifood nem rappi para entregar a comida. Mas ainda assim você me trazia a refeição por delivery todos os dias.

Mês 3 - No meu primeiro confinamento não tinha iPhone nem internet, mas você sempre dava sempre um jeito de fazer uma video-chamada para conferir se eu estava bem.

Mês 4 - No meu primeiro confinamento, não tinha YouTube, nem Live de sertanejo, mas você colocava música para eu relaxar todos os dias.

Mês 5 - No meu primeiro confinamento, a gente estava distante, mas eu sabia que você estava sempre ali por perto. Ainda que eu não pudesse vê-la, eu podia senti-la.

Mês 6 - No meu primeiro confinamento, morei em um lugar apertado. Mas mesmo com o isolamento recomendado pelos médicos, você sempre encontrou um jeito seguro de me levar para passear.

Mês 7 - No meu primeiro confinamento, não tinha TV a cabo, nem Netflix. Mas você sempre lia histórias para me distrair.

Mês 8 - No meu primeiro confinamento, não tinha porta, nem janela para espiar o mundo lá fora. Mas você sempre dava um jeito de receber as visitas.

Mês 9 - Meu primeiro confinamento não foi fácil e durou 9 meses, mas você fez de tudo para eu me sentir bem e confortável. Eu fiquei tão emocionado que chorei ao te ver pela primeira vez.

Neste dia das mães, estamos novamente confinados, de um jeito diferente. Por ironia, hoje demonstrar o meu amor e retribuir toda a sua proteção, é me manter longe de você.

Minha homenagem a todas as mães e mulheres que já nasceram prontas para enfrentar todos os desafios. A minha mãe, obrigado por cuidar de mim e tornar esta viagem melhor. Novamente estamos longe dos olhos, mas estaremos sempre conectados pelo coração. Te amo pra sempre. Perto ou longe, o amor não tem fronteiras e o isolamento vai passar.

quarta-feira, 8 de abril de 2020

Mantenha a louça limpa




Texto por Dudu Guedes

Muitas vezes, sem nos dar conta, deixamos a louça na pia crescer. Pratos sujos, copos empilhados, talheres jogados. Começa no correria do café, se estende no cansaço do jantar e às vezes chega até a preguiça do final de semana. Game over. Passou uma semana inteira e você ganhou nota 10 na matéria da procrastinação. É bem verdade que a rotina por vezes nos atrapalha, mas 3 minutos não irão mudar o seu dia.

Uma vez me explicaram que Feng Shui tem menos a ver com a cama apontada para o norte e mais com organização e limpeza necessárias para a energia circular naquele ambiente. Sem que fosse preciso verbalizar, meus pais sempre ensinaram com suas atitudes a importância de limpar a louça após as refeições. Confesso que só aprendi depois de velho, quando a maturidade me fez ajustar o olhar com lentes de aprendiz. E por vezes, hoje em dia ainda erro a lição. É necessário cultivar diariamente disciplina e ação.

O problema é quando a pia não fica na cozinha mas dentro de nossas emoções mais íntimas. Assuntos mal resolvidos, expectativas não alinhadas, medo de mudança ou simplesmente assistir a vida passar na janela não ajudam a manter a casa arrumada e so aumentam a bagunça interna. 

Em algum momento, a conta vai chegar com juros e correções monetárias. E para quitar esta dívida, não tem como negociar parcelamento em banco ou conseguir empréstimos. Não se trata de finanças. Não é matemática ou razão. É uma luta interna de você contra você mesmo. Um eu do presente que desafia o eu do passado. Um ringue sem platéia, sem juiz e sem marcação de rounds. 

Vale chute, soco e pontapé. Mas é melhor você acolher o adversário, pois se bater muito forte também irá acertar a si próprio e, se tentar fugir, ele vai te alcançar. Ele existe como a sua sombra e, de alguma forma, sempre estará ali, mas você não precisa viver em função dele. Melhor acolher o seu eu do passado e aceitar a mudança. Ele serve para explicar como você chegou até aqui, mas não precisa representar o seu futuro. Trate-o com amorosidade e coloque ele de volta na sua máquina do tempo. 

A meditação ja ensinou a olhar a vida como observadores e aceitar que os pensamentos são intrusivos e, portanto, é inútil tentar controla-los. Mas não é necessário sentar em posição de buda para de alguma forma levar os ensinamento desta técnica milenar para a sua vida. 

Seja como for, cultive pensamentos elevados, mantenha bons habitos, seja feliz e, como ja dizia meus pais, mantenha a louça sempre limpa. 

Darren, Samba e Riso Frouxo


Texto por Dudu Guedes

Darren é um desses caras iluminados. Nunca ouvi ninguém falar mal. Um homem de sorriso frouxo, daqueles que ri de graça. Um neo-zelandês que escolheu o Rio e aprendeu a sambar. 

Um homem elegante, impecável em se vestir bem. Com sua gravata amarela e colete preto era um destaque no meio da multidao. Mas o seu petgree internacional jamais o tornou indiferente. Pelo contrario. Usava roupas caras, mas vestia humildade e simplicidade. Falava com todo mundo com respeito e carinho. 

Darren transbordava generosidade, amizade e amor. Um cara que se preocupava com os outros e com o seu redor. Decidiu adotar as plantas do bairro. Cuidava dos canteiros das flores como se estivesse dentro de casa. Por puro e genuíno amor.  

E por falar em amor, sempre se referia a Zeze e Christopher com brilho apaixonado no olhar. Darren é família. E cuidava dos amigos como a sua família. Ele sim valorizava as coisas importantes da vida. 

Mas por ironia, a vida nos pregou uma grande peça. Hoje ele nos deixou aqui, pelo menos no plano terreno. 

Ficamos com a sensaçao de que você partiu cedo demais. Nunca estamos preparados para lidar com a morte. Talvez seja um egoísmo de querer prolongar a presença de alguém tão especial do nosso lado. Talvez seja ignorância por não entender completamento os planos de Deus. 

Obrigado pelo privilégio de compartilharmos um pouco da sua jornada ao nosso lado. Obrigado por dividir a sua luz para nos iluminar, por compartilhar seus sorrisos para nos alegrar, por transmitir seus conselhos para nos inspirar. 

Hj sentimos um grande vazio e nao temos vc aqui para nos acolher diante dessa dor.  Só nos resta erguer a cabeça e seguir adiante. Mas ainda assim, mesmo longe de nossa visão, vc continua nos ensinando uma grande lição. Trabalho e dinheiro são efêmeros e temporários. Temos que cuidar das pedras preciosas da vida.  

Continue sambando por aí. Faça uma tranquila e linda travessia para o lado do pai. Por aqui, sentiremos falta de você e do seu sorriso frouxo. Nossas lagrimas sao de saudade. Servirão para irrigar o lindo jardim que você plantou. E continue sorrindo que um dia nos encontraremos de novo. 

Quando eu cheguei nos 40



Texto por Dudu Guedes

Confesso que tinha um certo temor de chegar aqui. Afinal, quarenta anos representam quase a primeira metade da vida e naturalmente vem a cabeça muitos dos sonhos realizados, mas também muitos planos ainda a concretizar.

No trabalho, uma grande amiga perguntou o que eu tinha feito no meu último final de semana com 39 anos. Nada demais, respondi frustrado.

Finalmente chegara o dia. Fiquei acordado até meia noite e meia para me certificar de que nada mudaria. 12:45. 01:23. 01:45 e nada. Tudo continuava igual e resolvi dormir, afinal eu ja era um quarentão e o meu corpo tinha que descansar.

Dormi fácil e sereno. Parecia que o medo de chegar ate aqui fora muito pior do que a chegada. Honestamente estava gostando de ser um quarentão. Substitui a pressa da procura pela paciência da espera. Coração mais calmo acalenta a alma e transborda o amor.

Acordei cedo como de costume. Mas dessa vez não fui nadar. Caminhei pela praia bem cedo. Os pés descalços marcavam cada passo enquanto a agua do mar tratava de apaga-los. Na frente, a areia branca e virgem daquele dia me convidava para continuar o caminho, enquanto o sol amanhecia mais a frente. Simbologia forte que parecia gritar em meus ouvidos alguma mensagem. Não importa o que vc fez até aqui ou mesmo o seu ultimo passo, mas continue a caminhar e olhe em volta o que a vida ainda pode te oferecer. Dei um mergulho no mar gelado que pareceu me abraçar o corpo e refrescar a alma. Algumas gaivotas sobrevoavam o mar e pareciam se divertir.

Voltei pra casa, tomei um banho, café da manhã reforçado e fui ao trabalho. Fui presenteado com linda festa junina típica. Um cartão personalizado tornou aquele inicio de dia ou de segunda metade da vida ainda mais especial.
Agradeço a cada instante bom que fez a vida valer a pena e cada instante ruim que trouxe aprendizado e crescimento. Agradeço as pessoas que cruzaram o meu caminho e ja se foram, e aquelas que ainda permanecem nele. Agradeço a Deus pela vida, pela família e pelos amigos. Que minha segunda metade possa ser tão espetacular quanto foi a primeira. Obrigado.

Teoria da Escassez


Texto por Dudu Guedes
Escrito em 2016 

O jardineiro gentilmente podava as flores no jardim. Com uma tesoura na mão, ele ia aparando as plantas maiores alinhadas com as menores de maneira a delinear uma forma geométrica mais perfeita. Ele parecia um cabeleireiro da natureza dedicado a caprichar na sua obra. 

Me aproximo e pergunto: "O que você está fazendo?"

"Estou buscando um maior equilíbrio e harmonia", responde ele.

"Está fazendo algum desenho?", retruco.

"Preciso alinhar as plantas para que elas possam receber a luz do sol e só assim crescerão saudáveis", devolve ele.

"Como assim?", insisto.

"Para um jardim florescer, as plantas precisam crescer iguais. Se uma sobressai mais do que as outras, ela fará sombra na sua vizinha e isso limitará o seu desenvolvimento", explica ele.

Essa pequena paródia traz de forma subliminar a teoria da escassez e a cultura da abundância. Uma reflexão necessária aos tempos atuais aonde vivemos uma crise política e econômica sem precedentes, mas principalmente uma crise de valores éticos e morais, essencialmente egoísta e sem foco no coletivo.

Explicando o que é a cultura da abundância: o mundo nos fornece tudo aquilo que realmente precisamos em abundância e de maneira igual. A escassez é uma criação humana. 

O sol ilumina e aquece a todos por igual sem nenhuma distinção. A agua das chuvas irriga o planeta e sacia a sede de todos, sem escolher religião, escolaridade, cor de pele ou sexo. 

Quando colhemos frutos em nossa horta, se regarmos e cuidarmos, ela jamais pára de crescer e fornecerá assim novos alimentos.

Algumas teorias e estudos (publicados em revistas cientificas como a Nature) indicam ainda que existe uma espécie de consciência vegetal, onde as arvores conseguem se comunicar entre si através dos solos e identificar possíveis enfermidades entre as plantas doentes de qualquer lugar, criando uma rede de comunicação e promovendo a troca de nutrientes entre si para garantir um equilíbrio vegetal no planeta. 

No reino animal, o ecossistema não funciona se houver escassez. A extinção de uma única espécie provoca estrago com efeito cascata em toda a cadeia alimentar. A matança de tubarões prolifera a espécie das sardinhas que por sua vez gera o desequilíbrio alimentar.

É o exemplo da interdependência e cooperação mútua, onde mesmo o mais forte não sobrevive sem a existência do mais fraco. 

Se você cortar a pele acidentalmente enquanto faz a barba, o organismo atua para regenerar a pele através da multiplicação das suas células.

O sexo garante a reprodução e perpetuação das espécies.

A natureza ensina as leis universais. Basta observarmos para aprender como temos tudo em abundância de maneira igual e equilibrada, garantindo a continuidade e consistência da vida.

Entretanto, o homem e os princípios da economia do acúmulo desvirtuam o propósito natural da abundância. É a teoria da escassez. 

O homem é o único bicho que mata outros bichos por prazer (hobby) ou em quantidades maiores do que sua necessidade de sobrevivência. 

Não estou levantando a bandeira do socialismo e tampouco defendendo convicções políticas de esquerda ou direita. Sou a favor da competição e das leis de mercado. O problema não está aí. 

A competição sempre existiu na natureza na busca pelos alimentos e, segundo as leis de Darwin da evolução das espécies, sobrevivem os mais fortes. 

O problema está na competição desenfreada, quando uma empresa busca concentrar o mercado e eliminar a concorrência de forma desleal ou vantajosa. 

O problema está na desvalorização da forca de trabalho quando uma empresa, ao invés de reconhecer os seus funcionários como o ativo mais importante da sua produção, buscam sub-remunerar a sua mão de obra para maximizar os dividendos entre os acionistas em prol do desequilíbrio interno. 

O problema está em esmagar os acordos vigentes, quando uma empresa renegocia contratos com parceiros e fornecedores de forma unilateral. 

Isso tudo gera concentração além do necessário para poucos e a escassez para a maioria. Concentração gera escassez. Abundância individual gera escassez coletiva.

Alguns órgãos como o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) ou Sindicatos deveriam existir para garantir o equilíbrio das relações no mercado, mas por vezes são subvertidos a ganância de alguns que buscam promover a teoria da escassez em detrimento da cultura da abundância que existe na natureza.

Reclamamos da violência, da miséria e da poluição, mas não percebemos que somos parte originadora do problema, quando buscamos uma concentração alem do necessário e assim geramos escassez.

De que adianta o empresário que tem casa no exterior e jatinho particular, se existem grades e cercas elétricas ao redor da sua casa?

De que adianta o politico com cifras milionárias em sua conta corrente, se seu carro necessita de blindagem?

Ora, não defendo a idéia de que rico é vilão opressor e aristocrata, enquanto pobre é coitadinho. Pelo contrário, precisamos reconhecer os empresários que geram emprego, movimentam a economia e aumentam a arrecadação do estado. Empreender é ousar e exercitar o verdadeiro espírito do desbravador.

Entretanto é preciso diferenciar dinheiro bom de dinheiro ruim. Mil reais nem sempre equivalem ao dobro de quinhentos reais e algumas vezes também não remuneram o esforço empregado.

Agora, vamos trazer isto para a micro-realidade do nosso universo particular, além da deplorável manchete que assistimos todos os dias nos jornais. O que fazemos em nosso dia a dia ajuda a promover a cultura da abundância ou a fomentar a teoria da escassez?

Exemplos: 

Você é muito bem remunerado pela sua empresa, o que permite colocar o seu filho na melhor escola do bairro e viajar 2 vezes por ano com toda a família para destinos internacionais. Ao mesmo tempo, você paga um salário mínimo para a senhora que cuida da sua família ha mais de 15 anos.

Você comprou um sofá há 5 anos atrás e decidiu vender agora. Você comprou o sofá por R$ 2.000, mas quer vender por R$ 1.700 mesmo sabendo que ele vale menos.

Você tem um apartamento próprio no leblon e decide alugar. Ele vale em torno de R$ 2.000 mas você quer maximizar o retorno e consegue um cliente para pagar R$ 4.500, afinal trata-se de uma multinacional quem bancará os custos de aluguel do funcionário. Entretanto, você também trabalha na região e fica incomodado com os valores abusivos de refeição cobrados pelos restaurantes do bairro. Ora, o problema é a política e economia ou você também é parte dele?

No colégio, o pai ensinava ao filho que o mundo é competitivo e por isso, ele precisaria ser melhor do que os seus amigos. Isso gerava uma sensação de frustração pois na cabeça da seu filho, ele acreditava que trabalhar de forma colaborativa com seus colegas poderia leva-lo mais longe e criar um mundo melhor do que trabalhar de forma competitiva.

O homem decidiu se divorciar da mulher. Ele contratou o melhor advogado pois queria deixa-la com o mínimo possível ainda que ela tenha o apoiado durante toda a vida e esteja cuidando e morando com o seu filho. 

A mulher se divorciou do homem. Ele fez de tudo para que pudesse ser uma separação tranquila para os filhos e deixou o apartamento e uma pensão que cobriria todos os gastos dos filhos e um pouco mais, sem que ela precisasse trabalhar ou dividir as despesas. Mas ela achava que ele ganhava muito bem e queria um percentual maior do seu salário.

Ontem, peguei um Ubber que comentou que alugava o carro de outra pessoa por R$ 500 semanal e que isso estava lhe tirando o sono. Ele decidiu alugar o carro de uma locadora e reduziu o gasto para R$ 1.200. Finalmente, com a economia, conseguiu comprar um carro próprio. Será que sujeito que alugava o próprio carro por R$ 500 semanal acreditava que este era o valor adequado para o serviço? 
Afinal, qual o conceito de "preço justo"?

Preço justo é aquele que remunera os custos envolvidos, de forma a gerar margem e recuperar o investimento realizado mas preservando o equilíbrio em toda a cadeia produtiva e sociedade. Afinal, a sua produção também depende de todo o sistema. Os livros de marketing e administração ensinavam que uma clássica estratégia de precificação é ajustar o preço de acordo com a lei da oferta e procura. Cerveja em praia lotada no verão é mais caro que no inverno. Faz sentido. Mas não deveria ter um limite? Claro, uma garrafa de agua mineral no deserto certamente também tem um custo maior de logística e distribuição, além de uma procura maior do que a oferta. Entretanto qual a margem esperada com a atividade? 

Recentemente, em visita a Abu Dhabi, me chamou a atenção o preço de uma garrafa de agua mineral em torno de 20 reais versus um vinho que custava R$ 25. Logo, parecia fazer sentido. Entretanto, um copo de suco de abacaxi em pleno leblon que custa R$ 15 parece exagerado e possivelmente efeito cascata da teoria da escassez (imposto alto que gera aluguel caro que gera aumento de preço que gera desemprego para cortar custos e assim vai).

Claro, muitas vezes a origem de muitos problemas está nas políticas econômicas. Alta carga tributária para bancar a corrupção que gera estratégias de sobrevivência financeira. Mas o quanto suas decisões estão associadas a sobrevivência financeira de fato ou simplesmente concentração e escassez? Vale fazermos a reflexão. 

Ambição não é ruim, mas deveria ser compartilhada. Existe uma diferença entre acumular riqueza e concentrar riqueza. 

Competição saudável é aquela que promove o desenvolvimento social e equilíbrio em toda a cadeia, incluindo clientes, fornecedores, concorrentes e colaboradores. Competição ruim é chute na canela, arbitro parcial, torcida que não respeita o jogo e impede o adversário de sair do estádio.

Competição saudável valoriza o coletivo e percebe o efeito de interdependência na cadeia. Competição ruim foca em satisfazer os interesses particulares em detrimento do outro.

Na realidade, o paradoxo é que concentrar riqueza de forma desenfreada ou egoísta fomenta a cultura da escassez e isso de alguma forma vai chegar até você, seja através da violência, inflação ou desemprego.

Sejamos mais evoluídos que o bicho homem e capazes de crescermos com sabedoria em prol do coletivo e do olhar ao outro. Que a natureza possa trazer a abundância e nós sejamos capazes de mante-la. Afinal, como diz na música "é impossível ser feliz sozinho".

A alma nao envelhece


Texto por Dudu Guedes


Ela tem mais de 100 anos. As rugas revelam o quanto ja viveu, mas tb escondem a beleza da sua alma juvenil. "So preciso de um namorado", me confidenciou em tom de brincadeira. 

As pernas ja nao tem mais forcas para acompanhar a velocidade dos seus pensamentos. Mas suas mãos ainda tem as habilidades de uma artesa. Em cima da cama, 4 casacos de lã evidenciam o seu dom. Sua lucidez impressiona. Nao somente pela sua mente sã, mas pelo seu bom humor e sensibilidade. 

Dona alzira eh uma guerreira. Daquelas que permanecem no front da batalha sem abandonar a guerra. "So vou embora depois de ver meu bisneto", garante. Amem. Minha avó é mesmo uma figura muito especial. 

Confesso que nunca lidei bem com a morte. Creio que nenhum de nos, especialmente ocidentais. Desde criancas, estamos presos a materia como se o mais importante da vida fossem nossos carros, cartões de visitas (termos em ingles e com muitas abreviacoes sao garantias de impressionar o publico mais raso) ou forma do corpo. Sem hipocrisia, claro: ter dinheiro, sucesso profissional ou ainda estar bem cuidado realmente não tem nada demais. O problema é quando a matéria ganha uma dimensão maior do que ela é e comanda o show da vida. Nao penso que deva ser assim. 

Uma embalagem não define o seu conteúdo, ainda que profissionais de marketing tentem sempre te convencer do contrário (nao acredite neles). Mas uma regra é consenso neste mundo: cuidado para a promessa da embalagem não esvaziar o produto e frustrar a expectativa na entrega do conteúdo. Na vida também é assim. 

"Para saber como uma mulher será no casamento basta ver o jeito como ela trata os próprios pais" me aconselhou. Minha vó Alzira não é dona daquela marca de bolos que ficou famosa no Rio de Janeiro. Mas é uma aula de sabedoria

A vida eh um sopro. Hoje foi um daqueles dias dificeis, pesados, mas tambem carregado de reflexao. A jornada da vida é um grande mistério do qual conhecemos muito pouco ou quase nada. Como uma teia de linhas entrelacadas, as conexoes da vida se revelam através dos gestos mais simples e humildes do amor. Obrigado pelo privilégio da sua companhia.

Vulnerabilidade do Amor


(texto por Dudu Guedes)

Amor não aprisiona. Amor é plantado na chuva e semeado no vento. Claro, precisamos sim compartilhar as alegrias e celebrar as conquistas. Mas são nos momentos difíceis e de vulnerabilidade que percebemos o apetite do amor. Somente quando cortamos a carne e expomos o lado mais frágil que saberemos se o amor fugirá pela porta ou te pegará no colo. 

Se quiser descobrir se é amado, tenha diarréia e deixe a casa desarrumada. Claro, dividir o mesmo teto sem chance de paredão de eliminação semanal também não é tarefa fácil. Mas escolha regar o jardim gentilmente sem muita água para não afogar nem pouca para secar.

Anjos no caminho


Texto por Dudu Guedes

A cada dia, estou mais convencido de que anjos existem. Mas eles não aparecem com asas ou aureolas como aprendemos na infância. Eles se manifestam em outras formas mais usuais e menos clichê. 

Ja vi anjo aparecer em passarinho, crianca, cachorro de rua, livro, chuva, formiga, sapato escondido, motorista de uber ou taxi (acredite, eles nao tem preferência), enfermeiro, ambulante, e até em melancia ou sorvete. Nao importa. É preciso sensibilidade para notar sua presença e humildade para aceitar suas brincadeiras. Precisamos nos despir das vestes de adultos e colocar as lentes de observador. Basta ver um mundo diferente, com combinações de cores que não aparecem no windows. 

O brilho das estrelas só se revela nas noites mais escuras. Sim, sempre tem uma saída, sempre tem um caminho a seguir. Mas por vezes, buscamos atalhos e fugimos dos atoleiros. Impossível. Ninguém tem a garantia de uma vida sem dor. Mas a música já ensinou que "não se trata de chegar no topo do mundo e saber que venceu, mas escalar e sentir que o caminho te fortaleceu". Escalemos sem medo de cair. Que o medo te mova com segurança mas nunca te faça parar. E se for inevitável a queda, que os anjos do caminho segurem a sua mão para te levantar. E que saibamos ser gentis para permitir que eles entrem em nossas vidas.

A menina de 4 anos perguntou ao mestre: eu tinha um cachorrinho e ele morreu, como não me sentir tão triste? O sábio sorriu e respondeu: Você olha para o céu e percebe uma linda nuvem. A nuvem se transforma em chuva. Quando você bebe um chá, você pode sentir que aquela nuvem ainda está ali. Como um anjo disfarçado de bebida, o chá pode ser capaz de tocar seu coração e fazer você se sentir mais perto daquela situação.

No meio da calcada, tinha um beija flor. Sim, estava no canto, imóvel, e sem bater asas. Sem titubear, ela pegou o beija-flor e levou para casa. Seu pai gentilmente colocou em uma gaiola improvisada que não tinha porta. Mas o beija flor não voava. Todos os dias, vinha outro beija flor levar a comida através do bico. Durou quase 2 semanas, e finalmente ele voou.

Ela apareceu em sua vida meio sem querer. Como um milagre disfarçado de abrigo, lá estava a cadelinha parada na porta de casa com carinha de assustada. Sem titubear, ela foi levada para dentro e recebeu um pouco de agua e ração. Olhos azuis, médio porte, pêlo caramelo, cerca de 1 ano de idade, foi mesmo paixão a primeira vista. Não pela descrição física mas pelo carinho cativante de quem implorava cuidado e transbordava amor. Vida foi batizada com esse nome após tentativas frustradas de achar o seu antigo dono. Na verdade, ela adotou a nova família. Como um presente daqueles que vem embrulhado e gentilmente é deixado na porta de casa. Impossível recusar ou devolver a transportadora. Nessas horas, nos sentimos mais próximos da presença de Deus e quão grandioso e sábio é mesmo a natureza divina. Foi assim que meio que sem querer, Vida entrou naquelas vidas. De um jeito inesperado, com sua simpatia e jeito beijoqueira. Um anjo de quatro patas que ensina todos os dias o que é amar na sua forma mais pura e ingênua.

E assim os anjos se manifestam. Sem pedir licença ou por favor, inundam nossa vida com verdade e significado. Que sempre existam flores para regar e beija-flor para alimentar. Amém.

Primavere-se



Texto por Dudu Guedes


Ela nao se importa com cargo, salario ou carreira. Nao liga para dogmas nem julga pela religiao. Ela escolheu a verdade do seu coracao, prefere a duvida do que a certeza de uma vida vazia e de ilusao. Colocou a coragem acima do medo. Chora como uma crianca que nao tem medo de mostrar as suas fragilidades e pede colo. E é no momento que permite se deixar vulneravel, que se faz mais forte, mais intima de si mesmo e fortalece o amor de quem a ama. 

Na ciclovia, alguem gentilmente colocou um buque de flores em cada poste. Acima, uma placa orientava: "Primavere-se". E é isso que desejo para você com todo meu coração. Plante rosas em seu coracao. E se um dia chorar, que estas lagrimas sirvam para irrigar o lindo jardim que vc plantou.

Do Outro Lado



Texto por Dudu Guedes em 2018

A vida é como um sopro, dizia o poeta. Um sopro que pode ser longo ou curto. E isso não depende de quantos dias durou a sua vida, mas sim de quanta vida despejou nos seus dias.

Vovó não conseguiu andar até o local do sepultamento do seu irmão e decidiu esperar em um banquinho no meio do caminho. Tudo bem, não importava. Ali, era apenas o ritual de despedida da matéria. A presença de seu irmão estaria imortalizada para sempre nas nossas memórias e corações. 

Muita gente da família reunida por ali. Confesso que senti uma certa incomoda alegria ao reencontrar pessoas especiais que a vida distanciou, e que ironicamente a morte novamente aproximava de alguma forma. Definitivamente, ali não era o melhor lugar. 

Mas o que impressionava não era o fato em si, afinal de contas, tio David era uma homem centenário e forte. O que impressionava ali era a reflexão de que ao nascer, entramos todos em uma fila invisível para o outro lado. Recebemos uma senha sem que sejamos informados sobre o numero exato do nosso bilhete. Poderíamos até tentar estimar, mas seria inútil e em vão. É a única fila em que ninguém quer chegar ao destino final. Quanto mais cheia, melhor. Você não sabe exatamente quem está na sua frente ou atrás. Não importa. E não adianta querer dar a vez ou voltar para o final. A sua senha é pessoal, indecifrável e intransferível. Melhor guardar o bilhete e esquece-lo. Quando o seu número for premiado, de alguma forma, você saberá.

Do outro lado, Rafael e sua esposa recebiam os parabéns. Ela estava grávida e servia como veiculo para o milagre da renovação. Vida e a morte presentes tão perto, ali no mesmo lugar. Ao mesmo lado, a despedida para o novo e desconhecido, em formas diferentes. Do outro, o inicio de uma jornada na vida terrena, palco de sonhos, medo, alegria e frustração. A ambivalência do início e do fim, mas que de certa forma, também é fim e recomeço. O dia de finados não deveria ser usado com o propósito de homenagear os mortos, mas sim de celebrar a vida como a estranha antítese do velho e novo 

Visitamos o túmulo do vovô. Delicadamente, colocamos uma pedrinha em cima do caixão, como se pudéssemos nos aproximar dele. Não precisava. Ele ja estava por perto. Do lado de dentro. Em nossos corações. No caminho de volta, eu e meu primo lembramos de historias da nossa infância e de como sempre fomos crianças felizes por aqui. Sim, vovô também estava por ali se comunicando conosco de alguma forma.

Como diria Mario Quintana, "o problema não é morrer, mas sim deixar de viver". Por isso, levantemos do sofá da vida como meros expectadores. Esvazie os medos, mágoas e frustrações. Encha o peito com amor e alegria e saboreie o dia na sua plenitude, com todas as possibilidades e dores que o mundo te oferece. Coloque as lentes de quem está fazendo uma belíssima viagem de umas longas férias, onde nem tudo sairá como planejado mas ainda assim pode ser maravilhoso. Reinvente-se sempre e permita transformar tudo o que parece pesado demais. Mas o mais importante: ame, perdoe, viva e divirta-se ao longo dessa estrada. Quando chegar a sua hora de descobrir o que existe do outro lado, de alguma forma você também estará imortalizado por aqui.

Pequenas Alegrias


Texto por Dudu Guedes em 5/fev/18 

Ontem na praia, Matheus veio me cumprimentar. "Oi Dudu", gritou de longe com um sorriso genuíno e puro de criança enquanto jogava bola com os outros amigos. 

Comecamos a cavar um buraco na areia. A missão era chegar até o Japão. Ou Disney, como preferiu um deles. Não importava. O importante era construir a nossa passagem secreta que levaria a qualquer lugar da fértil imaginação infantil. 

Confesso que estava me divertindo. Talvez até mais do que eles. Tentaram desistir e quase encontraram outra brincadeira. Não deixei. Afinal ficaria ridículo na minha idade cavar um buraco sozinho na praia. Tudo bem, eles se sensibilizaram ao meu drama. 

No início, trabalhamos em revezamento. Demoramos a progredir. Depois trabalhamos em equipe e o ritmo aumentou. Matheus retirava a areia, eu limpava e Gabriel tentava proteger o buraco. As vezes não funcionava, e um barranco despencava na construcao. 

Aos poucos, fomos evoluindo e o buraco ficou digno de obra de engenharia. Cabiam 3 pessoas inteiras, apenas com o rosto para fora. Digno de fazer inveja a qualquer arquiteto. Quase solicitei certificado de aprovacao tecnica, mas ai tambem ja seria exagero.

O dia foi assim. Descontraído como o sorriso de uma criança. Como diz um amigo, precisamos de emoções verdadeiras, com menos emoticon. Precisamos de muito pouco ou quase nada para nos divertir. Basta abrir as cortinas do sutil e deixar o sol entrar. 

Famílias Coloridas



Texto por Dudu Guedes em 5/fev/18

Recentemente um grande amigo me brindou com o convite para uma palestra que ele faria sobre adoção. Ele e sua mulher adotaram Miguelzinho, um pequeno vascaíno de cabelo black power, jeito cativante e brincalhão. Uma figurinha. 

Independente de qualquer pretensão sobre adoção, confesso que no início tive um certo preconceito e resistência em visitar o grupo. Durante 1 hora de palestra, foi como um soco no estômago. Pensei que iria encontrar histórias tristes e gente esquisita. Tolice e arrogância que nasceram na ignorância de um assunto novo e desconhecido para mim. O que vi foram pessoas decididas, que colocam os sonhos acima dos próprios medos, que cultivam a capacidade de amar como seu bem maior, que entendem que existem muitos caminhos diferentes na vida mas que ainda assim podem ser maravilhosos.

O texto a seguir foi inspirado após um depoimento real que presenciei neste mesmo dia.

"Me desculpem os covardes. Nao sou gay, maluco nem pedofilo. Meu nome eh carlos renato, pai do Christopher em um processo de adocao tardia monoparental. Meu filho nasceu com 11 anos e com muito mais experiencia do que eu ja tive em toda minha vida. Em 44 anos, ainda não experimentei tudo que ele viveu.

Na verdade, ao contrario do que eu pensei, foi ele quem me adotou, eu apenas o reconheci. Na vara da infancia, ele confirmou todas as perguntas para que pudessem me oficializar como seu legitimo pai. Nossa primeira conversa foi a partir de um simples pedaço de papel. Quando o conheci, perguntei se ele sabia fazer um avião de papel. Pensei que eu estaria ensinando alguma coisa, quando ele prontamente me respondeu: sabe fazer um pavao? E imediatamente me fez em origami. 

Confesso que o inicio nao foi facil. Mas foi tao dificil como seria com quaisquer pais de um recem-nascido. No meu caso, eu nao tinha um bebe chorando dentro de casa, nao acordava no meio da madrugada, nem tive que trocar as suas fraudas. Mas também tive que reorganizar a minha rotina, ajustar minhas atitudes e rever os meus valores. A gestacao do meu filho nao durou 9 meses, mas sim 2 anos. Tempo suficiente para me preparar para o seu nascimento. Uma gestacao afetiva nao acontece no utero, mas no coracao. Hoje conversamos sobre musica e jogamos futebol. Ele é meu filho e meu melhor amigo. Me ajuda a cada dia a me transformar em um ser humano melhor. Me ensina quando eu menos espero. Me inspira e me faz crescer".

Familias adotivas são assim. Coloridas. Tem multiplas formas, cores e expressões. Ai de quem ousar questionar a sua origem. Não importa. Eles não se reconhecem por lanços de sangue, mas sim pelas batidas do coração. Estas sim parecem estar docemente ajustadas como uma musica que toca sempre no mesmo ritmo e nunca perde o tom.

Recomendo todos a visitarem o grupo "rosas da adoção" e seu belíssimo trabalho, independente da pretensão de adoção. Basta sentar e ouvir estas histórias para refletir o quanto a vida é boa, farta de possibilidades e generosa quando somos corajosos em seguir adiante. Sejamos autênticos nas próprias escolhas independente do julgamento dos outros. Obrigado ao Mauricio por me emprestar suas lentes para ver o mundo de outra forma e ensinar que a alegria se constrói na leveza e espontaneidade de nossas decisões.