segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Dia internacional da insatisfação do cliente



Hoje estava participando de um grande evento da indústria em que trabalho. Tudo ia muito bem e de repente tive uma visão estranha. Uma sensação de deja-vu esquisita, como se já tivesse vivido aquilo. Lembrei que todos os anos acontecia o evento, pensei. Mas lembrei também do símbolo máximo que aquilo tudo representava: frase feitas e gente que parecia muito importante com uma gravata pendurada no pescoço. Tirando o propósito (muito bem explorado por sinal) de reunir todo o setor, além de discutir tendências e desafios da indústria, o estereótipo parecia um grande circo bem organizado. Isso me trouxe uma reflexão maior de qual o sentido disso tudo.

Todos os dias pareciam iguais. As pessoas correndo de um lado para o outro. Prazos e prioridades. A pressa para cumprir a agenda das reuniões que não se revela na mesma pressa para beber água ou escovar os dentes. Cuidamos da empresa, mas não cuidamos de nós mesmos nem de nossas famílias. Negligenciamos a saúde em almoços de 15 minutos, engolindo sanduiches fast-food em prol de salários, bônus e status.

A fila para o taxi em congonhas parece uma grande rebanho ordenado pela chegada de cada carro. O elevador cheio onde um olhar nos olhos parece quase proibido. Melhor olhar para o chão, relógio, celular, teto ou acompanhar a marcação dos andares. Tudo com muita organização, mas com muito pouco sentido. Em uns, a gravata apertando o pescoço parece sufocar na garganta palavras tão curtas mas tão grandiosas, como "bom dia", "obrigado", "por favor". Aqueles que esboçam um gesto de maior intimidade e lançam um singelo "como vai?", ficam sem respostas. A pressa do dia-a-dia que engole nossa educação, elimina a sensibilidade às diferenças sociais e ignora qualquer emoção alheia, seja de dor ou alegria.

Seria injusto não reconhecer os prazeres que vida corporativa proporciona a executivos de grande indústrias, como viagens, restaurantes caros no fim de semana com a família, apartamentos e carros luxuosos, escolas de primeira linhas aos filhos e outros. Mas a verdade é que vivemos em uma referência circular que parece mesmo não fazer sentido. Buscamos dinheiro, mas temos pouco tempo para gasta-lo. Acumulamos fortuna, mas perdemos espiritualidade. Tudo em prol da eterna satisfação do cliente. Mas esquecemos que este mesmo cliente é feito de carne e osso. Este mesmo cliente somos nós próprios !

Quando vamos a um restaurante, vemos o garçom atordoado, correndo de um lado para outro, apressado em anotar o nosso pedido e ao mesmo tempo servir a mesa ao lado. Mas ignoramos a sua pressa, pois também temos a mesma pressa em almoçar para seguir a agenda de reuniões do dia. Quando pedimos uma pizza, o entregador tem menos de 30 minutos para entregá-la. Tudo gira em torno da satisfação do cliente.

Deveríamos instituir, pelo menos 1 vez ao ano, um novo feriado. Um feriado para cuidarmos da nossa família. Para cuidar da nossa alma, da nossa saúde, do nosso bem estar. O dia internacional da insatisfação do cliente. Um dia em que seria proibido se cobrar normas de atendimento. Um dia onde seria proibido multas do Procon. O vendedor de picolé na praia ficaria bebendo cerveja debaixo da barraca. O vendedor de cerveja por sua vez não estaria se preocupando em colocar gelo no isopor para saber se a cerveja está quente ou fria. O motorista de ônibus só iria fazer os trajetos desejados, se tivesse transito, ele iria tomar um café até o trânsito passar. O vendedor de coco só venderia o coco fechado, mas não teria a preocupação de abrir. O vendedor de biscoito globo só teria mate-leão. Um dia onde cada um iria cuidar de si, dos seus próprios interesses e de sua família.

Antes de julgarmos duramente um serviço, devemos lembrar da ironia da inversão de papéis que acontece em qualquer ecossistema econômico: em algum momento o nosso fornecedor será também nosso exigente cliente ... E quanto mais engessado julgarmos, mais severamente seremos avaliados.

Namastê, meus amigos.

E viva o dia internacional da insatisfação do cliente ! Eu já anotei na minha agenda !

Um comentário:

  1. Boa Big Fly,

    Concordo plenamente. Se pudéssemos nos dar ao luxo de pegarmos os nossos "trapos" e abandonar esta "panela de pressão" que é São Paulo, e por muito menos garantirmos maior qualidade de vida morando em pequenas cidades, a exemplo de Visconde de Mauá, Lumiar, Parati, e outras por ai a fora, certamente evidenciaríamos mais em nossos dias, a evolução da nossa alma e o sentimento puro com os humanos, pois a música e o contato com a natureza são de fato a maior conexão com Deus !!!

    Namastê Big Fly!

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